“Lição de Sapiência”

 

1- A estrutura organizativa.

 

Antes de mais quero agradecer-vos a todos a V. disponibilidade para aqui estarem presentes e resolvidos a ouvir esta “lição”. Pois que, de “sapiência”, veremos, após, se tem alguma. Mas cumprirei o meu dever.

 

Deixo uma palavra especial para o Dr. Vítor Rosa que, mais uma vez, deixa os seus múltiplos afazeres para nos honrar com a sua presença. Obrigado. Honra que não é menor, ao verificar que também Sensei Rosa Brites, Sensei Alexandre Gueifão e Sensei Jorge Costa, estão presentes, a quem agradeço e expresso a minha alegria por vos poder ter aqui comigo.

 

Permitam-me, todavia, que me demore um pouco mais com o Sensei José Patrão, que se encontra entre nós, o que muito me honra. É um homem de acção, sem deixar de ser, nesta, um contemplativo. À boa maneira oriental, onde intuição e acção devem ser a mesma coisa. José Patrão, é o mentor e o principal impulsionador do Centro de Artes Orientais, onde nós nos acolhemos, como Secção de Yôga. É um prestigiado budôka. É também meu aluno de Yôga, a quem tive o prazer de ensinar Yôga, assim como a outros cintos negros da Assocação Shotokai de Portugal, durante um ano. Um projecto no qual os Karatekas não queriam aprender Yôga, como mo comunicaram. E para o qual eu me lancei com energia, persistência e dedicação. No fim, creio que consegui ensinar-lhes Yôga. Pelo menos um pouco. Pois tenho constatado, não sem alguma satisfação, que passaram a incluir o súrya namaskár nas suas práticas, em alguns dos estágios que organizam. O que significa que, pelo menos esse pedacinho, consegui ensinar-lhes.

 

José Patrão é também o principal suporte da Surya online, revista que vai publicando artigos de um grupo de estudiosos destas artes do oriente e que já tem vários anos de existência. A sua vida constitui também um exemplo de dedicação a uma causa e a uma cultura. Podemos ver nele um paladino. E na sua pessoa saúdo o Centro de Artes Orientais e a Associação Shotokai de Portugal.

 

Saúdo também todos os restantes que, por serem da casa, me perdoarão a referência breve e rápida. E em especial, os meus discípulos, que  uma vez mais me acompanham nestas andanças. E que continuam a acreditar que somos capazes de concretizar a nossa missão. Continuando persistentemente a prosseguir os objectivos da Nossa Cultura.

 

Saúdo, em geral, a comunidade de alunos, professores, que integram as várias escolas que se agregam em volta do Centro de Artes Orientais.

 

Saúdo também os alunos que este ano vão frequentar o Curso de Formação de Instrutores de Yôga. Bem-hajam. Desejo-lhes um óptimo curso e muito sucesso.

 

Agradeço, em geral, a todos os que aceitaram o convite para participar neste importante acto.

 

Deixo por fim, uma palavra de reconhecimento e de admiração pela obra, ímpar e grandiosa, do meu Mestre, Shrí DeRose, que nos esforçamos por divulgar e promover.

 

Queridos amigos, alunos e discípulos. Caros Colegas

Minhas Senhoras e meus senhores

 

Esta sessão solene ocorre num momento de incertezas, de dúvidas, de expectativas. Num momento em que sofremos de uma crise de crescimento. Num momento em que, pelas características do nosso trabalho, pela qualidade que lhe imprimimos, pelas actividades em que nos envolvemos, temos recursos humanos que não conseguem já dar a adequada resposta, por exíguos.

 

Por outro lado, crise, porque alguns dos nossos instrutores não conseguem congregar a vontade dos seus alunos para participarem nos eventos e nas actividades, constituindo-se assim, também, um obstáculo ao nosso crescimento e capacidade de resposta e de intervenção.

 

Crise, porque queremos dedicar-nos a projectos e parcerias para as quais necessitamos de maior dedicação e dispêndio de tempo. Estudamos, neste momento, parcerias diversas instituições.

 

Também temos contado, recentemente, com a Câmara Municipal do Barreiro, que nos tem proporcionado a possibilidade de ministrarmos aulas públicas, gratuitas, no Parque da Cidade, proporcionando-nos, assim, um meio privilegiado e bem visível, de divulgarmos a Nossa Cultura. A Câmara Municipal de Palmela, também nos tem proporcionado apoio logístico, pelo qual estamos gratos e honrados.

 

Por isso, se o futuro se avizinha luminoso, está envolto num manto de preocupações.  .

O momento exige esta capacidade para fazer e aceitar um diagnóstico, rigoroso, das motivações dos que estão comigo e daqueles que me acompanharam no passado. Sou exigente. Muito. E o grau de exigência que imprimo pode, nalguns casos, resultar numa provação. Mas nestes caminhos, temos de equacionar a possibilidade de sermos postos à prova. Mesmo quando, em cada momento, não discernimos exactamente o que está em causa. E quando é chegado o momento de darem um salto evolutivo, seja como pessoas, seja como praticantes, seja no tipo de dedicação, seja pelas práticas e ensinamentos, mais intensos, mais exigentes, têm-me lá a indicar-lhes o caminho a seguir. Claro que percorrê-lo, como viandantes do subtil, isso já depende de cada um. O mestre só indica o caminho. Muitas vezes volta a percorrê-lo, com cada um dos discípulos, acompanhando-os para que não desfaleçam. Mas a eles cabe caminharem. Cabe aqui acrescentar o velho aforismo oriental de ser preferível ensinar a pescar a quem tem fome, em vez de lhe dar um peixe. Outros, de quem guardo boas memórias, mas cuja falta sinto entre nós, seguiram outras andanças.

 

Olho para todos vós e tendo noção daquilo que vos falta percorrer, também sei como evoluíram, como se transformaram. O mesmo olhar que me permite saber como, às vezes, não conseguem dar o passo que vos catapultaria à libertação mais rapidamente. Hesitam fazê-lo. Ficam enredados nas vossas perspectivas, convicções, teoremas sociais e pessoais. Enredados numa teia, quando, se se querem enredar, deveria ser na “trama do tecido” da Nossa Cultura. Ou seja, nas propostas do tantrismo.

 

Mas ainda assim olho-vos com admiração e carinho. A todos vós. Por também ver e saber o quanto já andaram, o tamanho da trajectória que já percorreram.

 

O momento não pode permitir silêncios e cumplicidades que poderiam ser, aparentemente, confortáveis, face aos tempos que correm, dizendo que tudo está bem e que estou totalmente contente com o caminho já percorrido. Seja em relação a cada um de vós, seja em relação a todos em conjunto. Tal significaria um capitular inaceitável perante os princípios e os valores, pelos quais nos devemos pautar, nomeadamente, o preceito ético – satya (verdade).

 

E é necessário fazer um diagnóstico, tanto no plano externo, como no plano interno.

 

No plano interno, há muito tempo que assumi a necessidade de repensar o nosso projecto cultural, a nossa maneira de pensar, agir e estar.

 

Os nossos departamentos não andam todos à mesma velocidade, nem com a mesma produção de trabalho. Andamos a duas ou três velocidades. Os directores executivos dos departamentos ainda não interiorizaram, totalmente, o papel preponderante que devem ter na organização e na direcção dos respectivos departamentos. Mas, não conseguindo manter sempre o mesmo ritmo, conseguimos, pelo menos, e assinalo-o de modo positivo, em todo o caso, mantermo-nos fiéis ao caminho traçado e trilhar uma boa parte do percurso.

 

É fundamental neste momento que saibamos quem somos, o que somos, o que queremos ser e para onde queremos ir. É tempo de acabar com as indefinições de carácter geral. Por isso estamos a preparar, para por à discussão colectiva, um Plano Estratégico para a próxima década.

 

Por isso é tão premente identificar com rigor as ameaças, as oportunidades, os pontos fortes e os pontos fracos.

 

Em relação a estes, que merecem particular atenção da nossa parte, temos:

 

  1. a) as dificuldades em atrair homens como alunos;
  2. b) o, ainda, limitado nível de interacção com o meio ambiente, não obstante as actividades que organizamos e para as quais nos convidam.
  3. c) o baixo nível de actividades de investigação e desenvolvimento por parte dos instrutores;
  4. d) o ainda limitado número de instrutores e ainda muito menor de Instrutores no grau de docente, com a perda que a Prof.ª Ana e o Prof. Juan representaram.
  5. e) a forte dependência da minha pessoa para a planificação e desenvolvimento de actividades nos departamentos.

 

Como pontos fortes há que apontar, indubitavelmente, o nosso capital humano. Não obstante os aspectos que há a corrigir, temos instrutores de alto nível, com grande conhecimento acumulado, com grande capacidade de entrega e com grande potencial de realização. É cada vez mais consensual, a importância estratégica que as pessoas desempenham e desempenharão nos próximos anos, no sucesso das organizações, num contexto global de acelerada mudança, de constante mudança do grau e do tipo de exigências que vão surgindo, seja lá qual for o ramo de actividade a que as organizações se dediquem. É hoje ponto assente que os recursos humanos, mais do que quaisquer outros, podem fazer toda a diferença numa estrutura organizativa. E da vossa competência, conhecimento e capacidade estou eu certo.

 

Também a nossa capacidade de congregar apoios e esforços de instituições, é um ponto forte.

 

O reconhecimento da qualidade das nossas realizações, do acervo de conhecimento que acumulamos é outro ponto forte.

 

Posso afirmar que temos, neste momento, no âmbito nacional um prestígio reconhecido. O que representa mais responsabilidade.

 

Revi, no essencial, o nosso projecto e a forma como vos orientava. Reabri os departamentos já com novos moldes de funcionamento. Passando apenas a ser integrados pelos que forem convidados pelas suas pessoais e especiais características. Consolidei, assim, a existência dos departamentos. Dei prioridade ao projecto Yôgayana em detrimento dos restantes projectos.

 

Em relação à V. orientação, como sabem, produzi profusamente doutrina, resultante da minha aprendizagem, da minha vivência nestas andanças e da minha experiência. Posteriormente, dediquei-me a um trabalho mais específico, mais pessoal, de maior proximidade e de orientação específica, com alguns de vós. Fi-lo sem precipitação, escolhendo, em cada momento, o caminho a trilhar, a técnica a utilizar, o trabalho interno de desenvolvimento a fazer. Trabalho pessoalíssimo, ao qual me entreguei, como faço nos projectos em que me envolvo, com intensidade e dedicação.

 

Os frutos desse trabalho são bons e estão à vista.

 

Com isto, creio ter consolidado a posição de alguns de vós. Que por cá estão e com que conto, a todos, ter ao meu lado, para o futuro.

 

Com as medidas tomadas creio ter consolidado a nossa posição, e ter criado as necessárias condições para crescermos.

 

Não cedemos a pressas conjunturais, que caracterizam, infelizmente, a tomada de algumas decisões estruturais. Com a revisão feita no nosso trabalho, as nossas linhas estruturais mantiveram-se, embora com ajustes conjunturais. Pois o caminho definido é justo e certo.

 

Reforçámos a interacção com o meio envolvente, com o nosso envolvimento num número cada vez maior de actividades em parceria, sendo que não estamos já passivos à espera que nos convidem, mas temos tomado a iniciativa de propor, apresentar, projectos, iniciativas.

 

Temos em funcionamento os departamentos de:

 

Ásana [Nadánta];

Mantra [Rájas agni]

Crianças [BalakiGanêsha]

Teatro [Purána]

Yôgacine

Protocolo

Formação e ensino

Informática [Sandezah Tantra]

Documentação e arquivo.

 

Deveremos em breve, ponderar na possibilidade da criação de um departamento de meditação.

 

Todos estes departamentos deverão passar a trabalhar, ainda mais, no sentido de criar conhecimento em cada uma destas áreas e de conseguirem congregar à sua volta os nossos melhores alunos. Pois da sua capacidade de o fazer também dependerá, em grande parte, o seu futuro, mas também o nosso futuro como organização.

 

Todo o trabalho que temos feito tem sido sem qualquer apoio financeiro seja de quem for.

 

Todas as mudanças pelas quais temos passado como organização e cada um de vós como pessoa, na vossa evolução e transformação interna, não têm representado decisões fáceis, nem um ano fácil. E a previsão para o próximo ano é de céu luminoso, uma ou outra vez algo nublado, sendo que espero algumas trovoadas. Veremos. Em todo o caso o futuro, nosso e de cada um de vós no Yôga, depende de nós. E por isso continuo a trabalhar, com os que estão, e trabalharei com os que virão, com os que querem dar um futuro à Nossa Cultura. Pois sou Tântrico, isto significa interveniente.

 

Caros amigos, alunos e discípulos, Caros Colegas,

Minhas Senhoras e Meus Senhores,

 

Não vale a pena iludir e acreditar que todo este esforço e trabalho se fará com facilidade. Mas cá estaremos com a nossa força, com a nossa capacidade, com a nossa dedicação e entrega.

 

A metodologia com que vos tenho orientado é corolário do que aprendi com os meus mestres, a quem devo a posição que hoje ocupo. Posição que devo mais à generosidade dos meus mestres do que ao meu mérito. Facto que não me canso de evidenciar. Junto ao que os meus mestres me legaram, o meu cunho pessoal.

 

Quero acreditar que esta lição será o ponto de partida para uma ainda maior transformação organizacional entre nós.

 

Quero acreditar que a reorganização do CFIY, que passaremos a analisar, possa ser vista como uma oportunidade de crescimento pelos instrutores.

 

 

 

2- O Curso: da validade; dos objectivos; da reestruturação. Breve análise do programa

 

Caros amigos, alunos e discípulos, Caros Colegas,

Minhas Senhoras e Meus Senhores,

 

Os meus discípulos sabem, pois tenho-os alertado para isso, que muitas vezes o artístico está a um passo do intuicional. E, mesmo sem o artista muitas vezes o saber, transmite-nos informação preciosa, verdadeiras pérolas. A música de fundo, quando entraram, era Sem Perdão do grupo 7.ª Legião. Escolhia-a intencionalmente. Nesta composição pode ouvir-se o seguinte poema:

 

Se a fé não mudar,

Se a noite acabar,

Vai nascer aqui o dia

 

Se a Lua deixar,

Se o sol me guiar

Só quero de ti um dia

 

Se a fé não mudar

E a noite acabar

Hei-de ver nascer o dia

 

Se a lua deixar

E o Sol me guiar

Hei-de ver nascer o dia.

 

É um poema de que muito gosto. Nos momentos em que me sinto em provação, às voltas no labirinto, perante os revezes, as contrariedades, o imobilismo, os ataques, com que tantas vezes nos deparamos, nestas nossas andanças, lembro-me muitas vezes destas palavras.

 

Desde logo, sobre elas, devo referir que interpreto , no seu sentido original, de firmeza na execução de um compromisso, ou de convicção profunda. Ora, se a nossa convicção não mudar e a lua deixar, se o sol nos guiar, haveremos de encontrar a luz, o dia, o caminho no labirinto.

 

Recentemente, o meu Mestre, Shrí DeRose, ensinava que [1]:

 

A Luz não deve temer as Trevas, pois quando as duas se confrontam é sempre a claridade que faz a escuridão recuar e nunca o contrário.

 

E para referir o que será tido como mais uma coincidência, aos olhos não treinados a ver para lá do óbvio, num dos artigos publicados na revista Surya online, Sensei Patrão declara o seu propósito com estas actividades a que se dedica. Passo a citá-lo:

 

Eu ando a juntar os que dão luz branca à roda a mesa em forma de prisma.

Quero ver o arco-íris!

 

Possamos todos nós, juntos, irradiar a luz que nos conduza ao arco-íris. Possa o Curso de Formação de Instrutores de Yôga, catapultar-nos, a todos, à condição daqueles qe irradiam luz branca.

 

Este curso tem a duração de 12 anos. E, nesta fase inicial, é composto por um conjunto de Seminários que decorrerão por um período superior a um ano.

 

Neste curso, para o qual vos desejo, aos que vão iniciá-lo, desde já, felicidades, não iremos encontrar astrofísica, física quântica ou anatomo-fisiologia, como em outros cursos de Yôga. Mas encontraremos, seguramente, Yôga. Posso prometer-vos que não será um curso fácil. Representará horas, semanas e meses e anos de estudo e prática. Será um curso onde deveis demonstrar um elevado nível de proficiência. Devereis ser capazes de ensinar, de argumentar, de investigar. Sereis, no futuro, cultores desta antiga filosofia, exemplos vivos duma linhagem tão antiga como a noite dos tempos, mas pujante, actuante e congregadora.

 

Os documentos de apoio, as normas, os ensinamentos, serão os do Yôga antigo, codificado e apelidado, na passagem ao terceiro milénio, de SwáSthya Yôga, por Shrí DeRose. Este Yôga tem os elementos integrantes de todas as outras escolas, daí que qualquer praticante de Yôga, ainda que queira trabalhar e seguir um Yôga menos autêntico, poderá frequentar o curso.

 

Iniciaram um percurso de 5 anos, dos 13 de duração total da formação. Devereis validar a Vossa formação todos os anos, nas datas marcadas para exame. Recebereis um certificado da formação que fizestes. Este certificado deverá ser renovado todos os anos, sendo-lhe aposto um selo de revalidação e por mim assinado. Que o vosso exemplo frutifique. Como diz Shri DeRose [2]

 

«Você é uma pessoa privilegiada por estar preparado para ensinar SwáSthya Yôga. Tornar-se instrutor de SwáSthya Yôga é ser depositário da confiança dos Mestres; é ser representante de Shiva; é ser pesquisador sério e missionário de saúde, beleza, felicidade e autoconhecimento.”

 

 

Doravante, lembrai-vos que representam Shiva, representam o SwáSthya Yôga, representam Shrí DeRose, representam-me a mim e, em última análise, representam-se a vós próprios.

(C)Copyright, João Camacho, Yôgachárya

[1] DeRose, Quando é Preciso Ser Forte, pg. 123.

[2] Programa do Curso Básico de Yôga, p. 68.

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