Texto que amavelmente nos autoriza a sua reprodução aqui no Nossa Cultura.
Anabela Duarte da Silva
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Cronologia Histórica do YÔGA | ||||
Divisão | Yôga Antigo | Yôga Moderno | ||
Tendência | Sámkhya | Vêdánta | ||
Período | Yôga Pré-Clássico | Yôga Clássico | Yôga Medieval | Yôga Contemporâneo |
Época | Mais de 5.000 anos | Séc. III a.n.e.[vi] | Séc. XI d.n.e.[vii] | Séc. XX |
Mestre | Shiva | Pátañjali | Gôrakshanatha | Aurobindo Rámakrishna Vivêkánanda Shivánanda Chidánanda Krishnánanda YôgêndraMestre DeRose |
Literatura | Upanishad | Yôga Sútra | Hatha Yôga | |
Fase | Proto-Histórica | Histórica | ||
Fonte | Shruti | Smriti | ||
Povo | Drávida | Árya | ||
Linha | Tantra | Brahmácharya |
4. História
A maioria das sociedades primitivas não-guerreiras (cuja cultura não era centrada na guerra) tinham as características do tantra. Elas valorizavam a mulher chegando mesmo a divinizá-la, em parte, por dar vida a outros seres humanos e alimentá-los com o seu seio. Era considerado um milagre, que o homem não compreendia ou conseguia reproduzir. Por esse motivo era adorada como encarnação da própria divindade. Através das práticas tântricas, era a mulher que despertava o poder interno do homem por meio do sexo sacralizado. Ainda hoje ela continua a ser reverenciada dessa forma na linha tântrica (como uma Deusa).
Conforme nos diz o Mestre DeRose[viii], a mãe dá à luz pelo seu ventre; isso é sensorial. Alimenta o filho com o seu seio; isso também é sensorial. Logo, não poderia ser contra a valorização do corpo, não poderia ser anti-sensorial como os brahmácharyas. A mãe é por norma mais carinhosa e liberal do que o pai, quer por o filho ter nascido do seu próprio corpo, quer por ser da natureza do macho ser mais agressivo e menos sensível. Tal comportamento tem também muita influência cultural, mas é sem dúvida reforçado por componentes biológicos.
Pelos motivos acima indicados e como consequência da sensorialidade, acentua-se a qualidade desrepressora do tantra. O impulso pelo prazer não é reprimido como ocorre noutras linhas comportamentais, pelo contrário, o tantra considera o prazer como uma via bastante válida na conquista do desenvolvimento interior.
Assim era o povo drávida, que vivia antigamente no território hoje ocupado pela Índia. Assim era o tantra que nasceu desse povo e assim era o yôga que existia nessa época: um yôga tântrico. Até ao dia em que a Índia começou a ser invadida pelos arianos.
Ao guerreiro não se admitia uma relação mais séria com a mulher, família ou qualquer afecto mais profundo, pois esses laços iriam amolecê-lo e consequentemente torná-lo receoso perante a expectativa da luta e da morte sempre iminentes. Tornou-se por isso contra a influência da mulher que frenaria a sua liberdade e o impulso de guerreiro; contra os prazeres que o tornariam acomodado; contra a sensorialidade, que o tornaria mais sensível à dôr perante o combate ou tortura. Por todos estes motivos ele era anti-sensorial, contra a mulher e contra o prazer. Por consequência, tornou-se repressor; começou a proibir o sexo, a convivência com a mulher[ix], e os prazeres em geral. Depois expandiu essa restrição, tornando-a uma maneira de ser, uma filosofia comportamental.
Quando os arianos invadiram a Índia há 3.500 anos, escravizaram os drávidas e impuseram-lhes a cultura brahmácharya (patriarcal, anti-sensorial e repressora), vendo-se forçados a abandonar a sua cultura tântrica (matriarcal, sensorial e desrepressora) por ser oposta ao regime vigente. Quem praticasse o tantra e reverenciasse a mulher, ou divindades femininas, era acusado de subversão e traição, era perseguido, preso e torturado até à morte. Com esta proibição – por razões políticas, culturais, e raciais (dado que, os arianos eram louros e os drávidas tinham pele escura e cabelos pretos: como é sabido, os genes dos segundos tendem a prevalecer sobre os primeiros; ao haver uma mistura de raças, tornou-se uma questão de sobrevivência da espécie árya) – o tantra tornou-se uma tradição secreta desde essa altura até aos nossos dias, dado continuarmos a viver num mundo predominantemente brahmácharya.
Por outro lado, obviamente como acontece em todas as conquistas, os arianos acabaram por absorver determinadas características culturais dos drávidas, revivendo a partir de então, práticas ancestrais expressas num vasto simbolismo: nas forças da natureza, nos mitos de imortalidade e liberdade, nos poderes mágicos e nos seus rituais. Todas essas características, mescladas às tradições arianas, fizeram com que o tantra se tornasse parte importante na formação do hinduísmo.
Os primeiros textos tântricos surgiram na Índia aproximadamente entre os séculos IV e VIII d.n.e., tendo influenciado várias filosofias, artes, ciências e religiões. Apesar da tradição tântrica já existir muito antes de ser registada em livros, é natural e frequente encontrarmos escritores que abordam o tema como tendo nascido durante esses quatro séculos. Isto por terem em consideração apenas o momento em que passa a haver registo escrito. No entanto, o tantra era inicialmente um modo de vida, e mais tarde, com a invasão ariana, tornou-se uma filosofia proibida e portanto secreta, pelo que era transmitida oralmente, não existindo qualquer registo escrito. Foi também nessa época, séculos IV e VIII d.n.e., que apareceram os primeiros documentos escritos em papel. O tantra ressurgiu no período medieval, com muitos rituais e uma linguagem devocional que tendia à religião. Por isso, quase toda a literatura tântrica é marcada por essas características.
Durante a sua evolução histórica, o tantra ultrapassou as fronteiras da Índia. Pode-se observar a sua influência principalmente na China e Tailândia, Tibete e Camboja, onde foi incorporado pelo budismo, lamaísmo e taoísmo, respectivamente. Visto a proposta do Swásthya Yôga ser a autenticidade e pureza das tradições, baseia-se essencialmente no tantrismo sob a óptica hindu. Foi na Índia que surgiu o yôga original, o Dakshinacharatantrika-Niríshwarasámkhya Yôga, hoje conhecido por Swásthya Yôga, como tal, está intimamente ligado à tradição e cultura dessa época, pelo que o essencial é perceber isso mesmo: as suas raízes, tradições, o yôga original. Tudo o resto, para o nosso estudo, é prescindível. Não trará valor acrescentado.
Existem mais de quinhentos Tantra Shastra[x]. Todas essas escrituras utilizam uma linguagem elaborada e de difícil compreensão para iniciantes. Alguns textos estão inacabados, outros são inconclusivos em muitos pontos importantes. ‘Grande parte dos textos perderam-se, foram extraviados ou destruídos e dos que sobraram, apenas uma parte foi impressa, cujas inúmeras versões, geralmente, se contradizem.’[xi]
É importante não esquecer que a linguagem utilizada para transcrever a maioria dos textos tântricos foi desenvolvida dentro de uma sociedade brahmácharya, na Idade Média (ou seja, numa sociedade além de brahmácharya, vêdantizada) e ainda traduzida para o inglês sob influência cristã, existindo a possibilidade dos textos terem sido submetidos a censura eclesiástica.
O tantra diz portanto respeito a todo um padrão comportamental que foi marginalizado. Após as primeiras incursões arianas na Índia, o modo de vida dos drávidas foi condenado e só mais tarde, na Idade Média, é que essa tradição emergiu, passando a ser novamente exercida.
Após a perseguição racial e ideológica exercida pelos arianos (brahmácharyas) sob os drávidas (tântricos), e para garantir a sua preservação (vakrat vak tantraram: tradição boca-a-ouvido) o tantra tornou-se uma tradição secreta – gupta vídya: conhecimento secreto – permanecendo secreto desde centenas de anos a.n.e. até aos nossos dias, praticamente não adianta ler sobre tantra: pode-se receber a informação, mas não a iniciação. Ficam a faltar as chaves que apenas são transmitidas de Mestre a discípulo.
A única via válida de acesso à aprendizagem eficaz e genuína é através da relação Mestre-discípulo. Obviamente, tratando-se de conhecimento secreto, é bastante difícil encontrar um Mestre, genuíno, conhecedor dessa arte. Mesmo após o encontrar é necessário que o candidato a discípulo seja merecedor de tal ensinamento. Além de outros requisitos é decisivo o caráter, a índole, a educação, a personalidade do candidato, bem como hábitos de vida como não fumar, não ingerir álcool ou drogas e não comer carnes de nenhum tipo. Mesmo quando todos os requisitos são preenchidos, poderá ainda existir um outro obstáculo: não nos podemos esquecer que continuamos a viver num mundo maioritariamente brahmácharya, e queiramos ou não, ainda que não concordemos com ele, somos parte dessa cultura e sociedade e nem sempre é fácil libertarmo-nos dela/de nós próprios.
5. Características e Princípios Tântricos
Os povos da Índia, de época dravídica e pré-dravídica, viviam numa sociedade onde a mulher ocupava um lugar de destaque. O carácter feminino das divindades no hinduísmo, nada mais é que o retorno, sob uma forma mitológica e simbólica, das tradições matriarcais. No Rig Vêda, por exemplo, a Shaktí é descrita como residente no Céu e como aquela que sustenta a Terra. A Taittiríya Upanishad diz: ‘considera tua mãe como uma deusa’. E Mircéa Éliade[xii]: ‘O que existe na Índia actual, em relação ao culto das divindades femininas, nada mais é que um segmento da herança matriarcal dos povos antigos’.
A palavra Shaktí significa energia ou força e pode ser interpretada sob três aspectos:
1º (de carácter popular) É simbolizado pelas imagens e expressado na devoção às divindades femininas do panteão hindu, tais como Saraswatí, Lakshmí, Kalí, Parvartí, etc. Shaktí é ainda apelidada de mãe divina: como sendo aquela que gera, nutre e protege.
2º Refere-se à própria mulher, por si só, como esposa ou companheira.
3º Fala-nos sobre a energia adormecida em cada ser humano: kundaliní e a força da criação.
No tantra não existe censura ou sentimento de culpa como é hábito frequente na cultura brahmácharya que dá valor principalmente à castidade. Por exemplo, no judaísmo, cristianismo e islamismo, o desenvolvimento interior só pode ser obtido pelo sofrimento e pelo controle dos impulsos, desejos e sentimentos. Ao contrário da cultura tântrica que demonstra que a evolução do ser humano acontece através da desrepressão e do prazer.
Shivánanda[xiii], apesar de ser Mestre de yôga de linha Brahmácharya/Vêdánta (oposta à Tantra/Sámkhya), faz elogios à linha tântrica, dizendo que ‘desdenhar ou negar as necessidades do corpo pensando que elas não são actos sagrados é desdenhar e negar a grandeza da unidade do todo, da identidade última da matéria e do que há além dela (…). As mais grosseiras necessidades físicas têm uma significação cósmica. O corpo é Shaktí. Suas necessidades são necessidades de Shaktí; quando o homem regozija-se, é Shaktí quem regozija através dele.’
De acordo com o Mestre Sérgio Santos[xiv], existem, no hinduísmo, dois movimentos culturais que caminham paralelos e que, por isso, estão próximos mas nunca se tocam:
– Váidika, com cerca 3.000 anos; refere-se àquilo que está nos Vêdas.
– Tantrika, com mais de 5.000 anos; refere-se a um agrupamento de tradições, cujos ensinamentos originais não estão compilados em livros.
Quase todos os hindus seguem a tradição váidika. Só uma ínfima minoria segue a tradição tantrika. Segundo o hinduísmo, ‘os tantras estão para os vêdas assim como o perfume está para as flores’. No entanto, apesar do que afirma o autor (Mestre Sérgio Santos), a própria cultura brahmachárya tem uma série de características do tantra, como por exemplo o culto à mãe. Motivo pelo qual a afirmação de que váidika e tantrika são dois movimentos que estão próximos mas nunca se tocam, poderá não estar totalmente correcta.
Uma máxima tântrica diz: ‘quando caímos ao chão, levantamo-nos com o auxílio do chão’. Tal afirmação é dirigida especialmente aos opositores do tantra, os quais dizem que para atingir a espiritualidade deve-se negar o corpo. Para os tântricos, se a natureza nos dotou de instintos, emoções e sentidos, consequentemente, tudo o que tenha a ver com isso deve ser naturalmente utilizado e valorizado, pois é uma eficiente ferramenta de evolução. Nascemos com um corpo e com ele vivemos até morrer. Devemos cuidar dele, cultivar a saúde e bem-estar de forma a melhor podermos explorar os seus/nossos recursos e potencialidades. É através do nosso corpo que poderemos evoluir e compreender o universo. O Vishwasara Tantra refere um outro provérbio tântrico que diz: ‘O que está aqui está em toda a parte, o que não está aqui não está em parte nenhuma’[xv].
O principal axioma do shaktismo, uma das linhas do tantrismo moderno, diz que todos os deuses estão no nosso próprio corpo. Isso significa que todos os processos químicos, biológicos e físicos da Natureza são semelhantes, quer seja numa folha de relva do nosso jardim, ou num coral fixado nos recifes de uma praia. Tudo o que está do lado de fora está do lado de dentro. Todos os tattwas da Prakriti reflectem o Púrusha como quem se olha diante do espelho.
De acordo com Van Lysebeth[xvi], ‘cada estrela tem vida, no sentido literal do termo, portanto está habitada por uma forma de consciência, a mesma que existe em cada partícula infinitesimal nuclear. Esta vida universal, única, subdivide-se em inúmeros planos de existência e consciência. Para o tantra, enche até a vida interestelar… Impensável? Talvez… Mas a imensidão do universo é impensável! Inclusive para o astrónomo que faz malabarismos com centenas de milhares de anos-luz. Essas distâncias enormes são inimagináveis, e no entanto bem reais!’
A base filosófica das escolas tântricas é o conceito de Shaktí e Shiva: representando os princípios feminino e masculino, energias de polaridade negativa e positiva, respectivamente. Shaktí simboliza o poder dinâmico e Shiva o poder estático. São os dois pólos opostos que mantêm a coesão universal sem os quais não haveria harmonia no cosmos.
No tantrismo diz-se que Shiva sem Shaktí é shava (um cadáver). Sem Shaktí, Shiva não teria como agir, falar, pensar, ver ou sentir. Sem ela, a natureza não teria forma; sem ele, a natureza não teria como manifestar-se. O poder criador manifesta-se devido à presença da criação e vice-versa (por exemplo, no caso de uma lâmpada são necessárias duas cargas de energia opostas para que se acenda).
No seguimento do que foi exposto, conclui-se que o tantra tem características filosóficas similares à filosofia Sámkhya, sendo que muitos dos princípios tantricos foram sendo estabelecidos no decorrer dos séculos como uma extensão dos tattwas do Sámkhya.
6. Tantra de mão direita
Existem vários tipos de tantra, sendo os mais importantes: Dakshinachara (de direita), e Vamachara (de esquerda). Além das várias escolas de tantrismo temos ainda as influências exercidas pelo tantra sobre outras filosofias, arte, sistemas e religiões, como é o caso do Budismo Tantrico, Taoísmo Tantrico, Arte Tantrica, Magia Tantrica, Yôga Tantrico, etc.
Existe um grande emaranhado, uma grande mistura de sistemas que o consumismo ocidental providenciou de forma a vender melhor, explorando a desinformação da opinião pública. Pelo que é conveniente um grande discernimento de forma a não ‘comprar gato por lebre’. A tradição oriental não admite este tipo de confusões e misturas.
7. Os Tattwas do tantrismo
Existem vários ramos de tantrismo, uns mais importantes, outros mais conhecidos, tais como o shivaísmo, o vishnuísmo, o shaktismo ou tantrismo shakta. Este último ficou muito conhecido através das obras de Sir John Woodroffe.
Todas as formas de tantrismo possuem princípios comuns que se demonstram através dos tattwas. Pode haver variações quanto à interpretação de cada princípio em si, mas não altera a visão de conjunto.
O tantrismo possui trinta e seis princípios, dos quais os últimos vinte e cinco são os mesmos do Sámkhya, o que nos demonstra a relação inseparável do tantra com o Sámkhya. Pode-se portanto concluir que o Sámkhya é parte do tantra. Isso demonstra-nos que o Sámkhya tem afinidade com o tantra (como no Yôga Pré-clássico) e não com o brahmácharya (como no Yôga Clássico).
[xvii]
8. As três linhas do Tantra
No tantra existem três linhas de comportamento:
– Tantrismo branco ou linha branca (dakshinachara ou Dakshina Márga – mão direita[xviii]);
– Tantrismo negro ou linha negra (vámachara ou Váma Márga – mão esquerda[xix]);
– Tantrismo cinzento ou linha cinza (kaulachara).
A divisão em linha branca e negra é apenas uma forma didática de nos referirmos a comportamentos tântricos opostos. A linha branca foi desenvolvida pelos drávidas, e a negra – mais recente – foi desenvolvida com maior intensidade no século VIII d.n.e., sujeito a interferências da filosofia Vêdánta é a corrente mais ritualística. A linha cinza inclui elementos das duas outras linhas; branca e negra.
As três linhas do tantra caracterizam-se pela utilização ou não de: álcool, tabaco, drogas, alimentação com carne e relação sexual com orgasmo. Assim sendo:
– Linha branca; subtil, discreta, desaconselha o uso de drogas, álcool, tabaco e ingestão de qualquer tipo de carne. Pode ser de:
· Via sêca: sem contacto sexual. Esta via é utilizada apenas temporariamente.
· Via húmida: com contacto sexual;
¨ Com retenção do orgasmo
¨ Sem retenção do orgasmo
– Linha negra; utiliza drogas, álcool, tabaco e ingestão de carne.
– Linha cinza; inclui características das linhas branca e negra. As várias escolas dão importâncias diferentes a algumas características do que a outras. Para se ser de linha branca ou negra é necessário que observe pelo menos 80% das características da respectiva linha, caso contrário, fará parte da linha cinza.
Apesar da via sêca se assemelhar à linha brahmácharya – em ambas o indivíduo se priva do contacto sexual – elas são totalmente distintas: na linha brahmácharya o indivíduo reprime a sua sexualidade (é-lhe imposta a abstenção do sexo, para todo o sempre); na linha tântrica o indivíduo cultiva a sua sexualidade (a abstenção do sexo é uma opção).
Ambas as filosofias, tântrica e bráhmacharya, atribuem grande importância à energia sexual, apenas a forma de utilização e métodos para atingirem o objectivo diferem: enquanto a tântrica pretende potenciá-la (energia gera energia) e trabalhá-la, a bráhmacharya pretende guardá-la, preservá-la.
Sendo o Swásthya Yôga o yôga mais antigo e autêntico, excusado será dizer que é um yôga de linha branca (aliás como o próprio nome, antes da sistematização, indica, Dakshinacharatantrika-Niríshwarasámkhya Yôga).
9. As sete escolas do Tantra
As sete escolas do tantra são:
– Dakshinachara (a mais antiga, por isso considerada original – mais autêntica – e adoptada pelo Swásthya Yôga);
– Vêdachara;
– Vaishnavachara;
– Shaivachara;
– Siddhantachara;
– Kaulachara;
– Vamachara.
Achara é um sistema comportamental. Significa via, caminho ou linha.
10. Iniciação tântrica
Citando o Mestre DeRose[xx], o termo shaktí significa energia. Por extensão, designa a companheira tântrica, que pode ser esposa, amante ou amiga. Dependendo do uso na frase, pode também referir-se à Kundaliní ou à Mãe Divina.
Conforme foi dito atrás, o tantrismo diz que ‘Shiva sem Shaktí é shava’, ou seja, o homem sem a mulher é um cadáver. Shiva é o elemento masculino, que deve ser potencializado pela Shaktí, elemento feminino.
A mulher, enquanto companheira, denomina-se Shaktí, que significa literalmente energia. É aquela que energiza, que faz acontecer. Sem a mulher, o homem não evolui na senda tântrica e vice-versa. São necessários os dois pólos: positivo e negativo. Pólos diferentes atraem-se, polos iguais repelem-se. Vejamos o caso de uma lâmpada: podemos fazer passar qualquer quantidade de electricidade por um fio e ainda assim ela não se acenderá, a menos que haja um pólo positivo e outro negativo, um masculino e outro feminino. O mesmo acontece nas práticas tântricas.
O tantra possui ainda uma componente fortemente poética, que contribui para tornar as pessoas mais sensíveis e aumenta o senso de respeito e de amor entre homem e mulher, dizendo que: para o homem, a mulher é a manifestação vivente da própria divindade e, como tal, ela deve ser reverenciada e amada. A recíproca é verdadeira, pois a mulher desenvolve um sentimento equivalente em relação ao homem.
O tantra pretende despertar a kundaliní, actuando sobre a energia sexual; muladhára, swádhistána e agña chakra. É muito forte, artístico, sensível, colorido, vivo, real, mágico, subtil. Deve ser pessoal. O tantra pode ser portanto um atalho dentro do atalho que já é o yôga, podendo-se dizer que o yôga de linhagem tântrica ensina como alcançar os mais potentes e rápidos resultados através do prazer e do trabalho com a libido.
No que respeita a iniciação tântrica, visto o tantra ser uma tradição secreta, praticamente não adianta ler sobre o assunto, pois tem-se acesso à informação mas não à iniciação. As chaves são transmitidas apenas de Mestre a discípulo. A iniciação tântrica só pode ser feita por um guru; daí a importância do Mestre, o único que pode transmitir, de boca-a-ouvido, a doutrina secreta, esotérica[xxi]. É necessário pois, encontrar um Mestre fidedigno a fim de receber a iniciação. Após encontrar o Mestre, é necessária a aceitação do ‘discípulo’ por parte deste. Para tal, serão tidos em conta vários aspectos do candidato, como: intenções, honestidade, carácter, índole, personalidade, hábitos de vida (ingestão de carne, tabaco, álcool, drogas), educação, mérito, lealdade, disciplina, cultura, sensibilidade, beleza, arte. Daí a suma importância do aprimoramento do carácter. Do auto-conhecimento e superação.
A chave da iniciação no maithuna é a contenção orgástica. A contenção do orgasmo deverá ser feita através de bandha e kumbhaka, de forma progressiva: uma vez no primeiro dia, duas no segundo, e assim sucessivamente. O primeiro ciclo deverá ser de um dia, o segundo de dois dias (ao fim do qual se deverá ter um orgasmo), o terceiro de três dias (ao fim do qual se deverá ter um orgasmo), e assim sucessivamente, aumentando sempre um dia até se chegar ao 30º ciclo no qual se deverá reter a energia orgástica por trinta dias seguidos. Quando o maithuna chegar a uma hora de duração, os resultados serão avaliados e as normas alteradas.
11. O Mecanismo Biológico do Tantra
Descobriu-se há muito que para a natureza o indivíduo é descartável, já a espécie não. A espécie deverá ser preservada a qualquer custo. Se isso for útil à espécie, a natureza poderá eliminar milhões de indivíduos. Exemplo disso são as sociedades de insectos; quando milhões de formigas ou de abelhas se sacrificam voluntariamente pelo bem do formigueiro ou da colmeia. Podemos observar também um comportamento semelhante no ser humano; numa história de guerras tribais, entre nações, ou envolvendo praticamente todo o planeta.
Há algumas décadas foi feita uma experiência com trutas em laboratório: colocaram-se algumas fêmeas prontas a desovar num aquário circular onde se simulava uma corrente. As trutas mantiveram-se a nadar contra a corrente, sem parar, desovar e sem se cansarem. Passado um tempo, retirou-se uma das trutas desse aquário e colocou-se num outro com água parada. De imediato essa truta desovou e morreu de seguida. As restantes trutas mantiveram-se a nadar contra a corrente no outro aquário por um período de tempo muito superior. Esta experiência é mais um exemplo do peso da procriação – utilidade do indivíduo para a espécie – e o que isso pode significar entre o tempo de vida e de morte.
Outro exemplo ainda, é o verificado em espécies como o zangão, louva-a-deus, ou alguns tipos de aranha, em que os machos são mortos pela fêmea no acto da fecundação. Após terem cumprido o seu papel na fecundação deixaram de ter utilidade para espécie[xxii].
Sabendo que a natureza descarta o indivíduo mas luta para preservar a espécie, podemos concluir que, pela lei natural, quando um indivíduo se reproduz já cumpriu a sua obrigação perante a espécie, pelo que o seu organismo passará a um processo mais acelerado de decadência no sentido da morte. No entanto, ao praticar maithuna, segregando hormonas sexuais em abundância e de seguida reter o orgasmo, criará artificialmente um estado de permanente disponibilidade para a reprodução. Dado que a natureza preserva um reprodutor visto ser útil à espécie, esse indivíduo será protegido contra doenças, envelhecimento e até acidentes, pois mantém-se com mais reflexos e mais inclinação a Eros (impulso de vida) que a Tânathos (impulso de morte). Quando o impulso de Eros é predominante, o indíviduo manifesta melhor disposição para a vida e maior vitalidade: desfruta de mais saúde, menos enfermidades e depressão, por isso também apresenta menor propensão a acidentes.
O que diferencia o ser humano do animal ‘irracional’ é que o primeiro usufrui da liberdade para interferir nos processos naturais, enquanto que o outro é levado pelas forças do instinto – quando sente o impulso fisiológico, acasala e tem uma relação sexual trivial.
No reino animal, podemos observar que quando os indivíduos estão aptos à reprodução (quando têm muitas hormonas sexuais) tornam-se exuberantes e muito mais fortes. Pode-se constatar um efeito semelhante nos praticantes de maithuna. Por esse motivo – quantidade de hormonas sexuais presentes – é importante mencionar que a abstinência sexual não tem o mesmo efeito, já que a natureza tende a desactivar as funções que não são utilizadas. Dessa forma, em pouco tempo as gonadas deixam de segregar as preciosas hormonas e o indivíduo perde a vitalidade. No entanto, na via sêca do tantrismo o mesmo não acontece, pois a opção pela via sêca é mantida por um determinado período de tempo apenas, e não definitivamente.
O mecanismo biológico do tantra baseia-se em manter altos níveis de hormonas sexuais através da técnica de produzir excitação e conter o orgasmo. Ao manter a energia (em vez de a deixar esvair-se), o organismo mantém uma disposição constante para o acto sexual, pressuposto da reprodução, por isso a natureza o protege e preserva.
12. Diferença entre cavalheirismo e atitude tântrica
Quer no cavalheirismo, quer na atitude tântrica, o homem deverá abrir a porta do automóvel, puxar a cadeira ou ceder a passagem à mulher. Mas com propósitos diferentes: enquanto no cavalheirismo inconscientemente essa atitude deve-se a uma necessidade, por uma incapacidade da mulher (e para melhor o compreendermos devemos regredir aos tempos em que estas usavam roupas que dificultavam os movimentos, onde praticar desporto ou transpirar era uma grande falta de refinamento). Já no tantrismo, esse procedimento é feito por reverência, dado a mulher ser considerada uma divindade encarnada.
13. O prazer como alavanca para a evolução interior
A proposta do tantra é desencadear autoconhecimento e evolução interior a partir do prazer. É o exacerbar do prazer físico a tal dimensão que irá extrapolar os limites físicos e transbordar levando ao aprimoramento. A corrente tântrica produz portanto aprimoramento através do prazer.
Vários povos, ao longo de várias épocas, utilizaram estas técnicas: existe um Budismo tantrico, um Taoísmo tantrico, um Yôga tantrico e até mesmo um Cristianismo tantrico.
14. A relação sexual
No tantra, a relação sexual é denominada maithuna. O maithuna compreende, desde que haja intenção, oito maneiras diferentes de se estabelecer contacto sexual:
– Olhar para alguém do sexo oposto;
– Andar com alguém do sexo oposto;
– Falar com alguém do sexo oposto;
– Pensar em fazer sexo com alguém do sexo oposto;
– Desejar a união sexual com alguém do sexo oposto;
– Propor a união a alguém do sexo oposto;
– Ter a determinação quanto ao acto sexual com alguém do sexo oposto;
– Cumprimento do acto sexual com alguém do sexo oposto.
Ao contrário dos costumes arianos, o tantra não trata questões morais ou depende dos modismos sociais. No tantra não há dogmas e muito menos culpa ou pecado, conceitos típicos das tradições patriarcais.
Na tradição tântrica, ao contrário da tradição brahmácharya, a mulher ocupa um papel preponderante: é ela quem, de modo geral, toma a iniciativa para o sexo. Uma forma de identificar a influência do tantra numa escultura ou pintura hindu, que represente um homem e uma mulher, é verificar se a mulher está por cima ou à frente do homem (em primeiro plano).
O tantra define três tipos de mulher[xxiii]:
– Mudrá; qualquer mulher que possa servir ao homem para efeito do exercício do maithuna.
– Shaktí (esposa ou companheira); mulher em igualdade de condições com o parceiro, circunstância na qual há uma troca de energias e ambos evoluem na senda tântrica.
– Dêví (Deusa); a mulher domina todas as relações afectivas, profissionais, etc. Tem o poder de desencadear atracção e desejo, e despertar potencialidades no homem até então desconhecidas, bem como sua submissão perante um tal e inegável poder.
O homem e a mulher têm o poder não só de influenciar, mas também de reverter os processos da natureza. Poderão praticar sexo meramente como uma descarga fisiológica e um meio de preservação da espécie, mas também como uma alavanca de aprimoramento, evolução pessoal, e consequentemente em benefício da humanidade. Todas as linhas do tantra ensinam técnicas e cultivam intensamente o maithuna, procurando prolongar o prazer e a duração do acto. Porém, apenas a linha branca utiliza a relação sexual sem orgasmo.
15. O contacto sexual sem orgasmo
No Dakshinacharatantra, o contacto sexual sem orgasmo é uma opção recomendada. De notar que orgasmo e ejaculação são coisas diferentes: o orgasmo é a energia que se descarrega no final da relação; ejaculação é a matéria orgânica (sémen) que se elimina em simultâneo com o orgasmo, ou não. Para o tantra apenas interessa o aproveitamento dessa energia, o orgasmo (que usualmente é desperdiçada no final da relação, quer na mulher, quer no homem).
Com a sua postura desrepressora, o tantra conhece as funções, dá ênfase e tira proveito da prática do maithuna, permitindo o desenvolvimento das potencialidades do ser humano, levando-o ao auto-conhecimento. Apesar de o tantra o ensinar há muito, só agora começa a ser confirmado através de pesquisas científicas feitas no mundo inteiro sobre a energia orgástica.
Analisando os dois gráficos abaixo, constatamos que no primeiro há uma subida de excitação, uma brusca elevação (orgasmo), e em seguida a depressão rápida até ao nível zero. No segundo gráfico, observamos que antes da energia sexual chegar ao clímax e culminar no orgasmo, o praticante diminui a intensidade do contacto, deixa que o corpo se restabeleça, e dá continuidade ao exercício. Exercício esse que pode durar alguns minutos e prolongar-se por várias horas.
Na relação sexual do tantra, o que ocorre na esfera genital com a ampliação energética, é que a excitação e o prazer vão tomando conta de todo o corpo e psiquismo do praticante.
Com o desenvolvimento da potência sexual e da contenção do orgasmo, pode-se entrar em níveis de consciência supra-humanos (sabe-se há muito que o ser humano utiliza apenas 10% das suas capacidades). É por este motivo que o tantra considera o parceiro sexual como uma divindade em carne e osso.
Ambas as linhas, negra e branca, pretendem a ampliação da energia sexual. Entretanto, há diferença de opiniões entre as duas: depois de um longo contacto e de uma intensa satisfação, enquanto que, na linha negra tem-se o orgasmo no final da relação, na linha branca sugere-se a contenção do orgasmo. Segundo esse ponto-de-vista, o orgasmo nada mais é do que o fim do prazer: Omni animale post coitum triste est.
Na retenção orgástica o indivíduo aumenta tanto a força genésica que, simplesmente, a natureza o preserva. Com isso, atenua-se tanatos, o impulso da morte e destruição; e intensifica-se eros, o impulso de vida. Sendo um reprodutor em potencial, possivelmente útil à espécie ser-lhe-á garantida uma vida mais longa e plena.
Entre as consequências da exacerbação do prazer e do refreamento do orgasmo estão: o aumento do próprio desempenho sexual, a melhoria da saúde, o aumento da capacidade imunológica, ampliação dos sentidos, das percepções sensoriais e extra-sensoriais, dos reflexos, bem como mais alegria e menos depressões, melhor produtividade no trabalho, nos estudos, no desporto, etc.
Para usufruir da energia gerada pelo maithuna saudavelmente é necessário que o indivíduo tenha uma excelente infra-estrutura física e psíquida. Essa infra-estrutura é obtida pelas técnicas do yôga, nomeadamente pelo ashtanga sádhana. Além das consequências do maithuna acima citadas, o praticante de yôga constatará que a sua força sexual irá auxiliá-lo no despertamento da kundaliní e, consequentemente, ao alcance do samádhi, a meta do yôga.
16. Outras práticas tântricas
Como método de evolução do ser humano, o tantrismo recorre às práticas do yôga. Algumas dessas práticas são:
a) Pújá
Pújá pode ter vários significados: oferenda, honra ou retribuição de energia ou de força interior – formas pelas quais nos referimos ao pújá no Swásthya Yôga – ou ainda, adorar, prestar culto, venerar, honrar ou reverenciar (comumente utilizado no tantrismo).
O pújá é uma forma natural e instintiva de retribuição, como por exemplo: uma criança chegar à escola e oferecer uma flor à professora.
O pújá faz parte de todas as tradições orientais. Na Índia, temos o pañchapújá que consiste nas cinco formas de pújá externo – flores, frutos, incenso, tecidos, dinheiro – através do qual o devoto faz uma oferenda ao templo ou à sua divindade. O yôga também utiliza o pújá, mas geralmente é feito sem objectos materiais – como o manasika pújá (pújá mental) – oferta de energia, amor, carinho, lealdade, votos de saúde, prosperidade e felicidade, feita pelo discípulo ao seu Mestre.
O pújá efectivo contém uma enorme intensidade de bháva (sentimento, devoção, atitude interior, disposição).
Existem quatro níveis de bháva no tantrismo[xxiv]:
– Primeiro nível – pújábháva; subdivide-se em externo (bahya), e interno (manásika) – conforme acima mencionado.
– Segundo nível – japabháva; feito a partir da repetição de mantras, vocalizados verbalmente ou mentalmente.
– Terceiro nível – dhyánabháva; consiste em ampliar a concentração no objecto da devoção.
– Quarto nível – swabháva; o mais alto tipo de bháva, último grau.
Na linguagem shakta, swabháva é a compreensão da Shaktí na sua própria essência, contida em todas as manifestações do Universo. De acordo com Gandharva Tantra, ‘aquele que está sempre unido ao seu adorado perceberá, certamente, sua presença em tudo o que vê, ouve, sente, cheira; em qualquer ser da natureza, mineral, vegetal ou animal; em todo o objecto e pessoa, em toda a comida e bebida, na música, nas roupas, nas festas, desde o estado de vigília até o de sono profundo. Quando, enfim, a presença do outro é uma constante em seu coração, tal praticante estará em swabháva…’
O pújá, como um processo de empatia entre aquele que faz e aquele que recebe, é directamente ligado ao nyása (identificação). É um tipo peculiar de concentração que actua principalmente no psiquismo, e consiste na capacidade de se estabelecer uma sintonia profunda com pessoas vivas ou não; com personagens que existiram realmente ou com formas mitológicas; ou ainda, com um animal, uma árvore, uma flor, uma pedra, etc. O nyása é como um cristal transparente, que absorve em si a forma e a cor do objecto que lhe é próximo. No fundo, o nyása funciona como uma forma intensa de conhecimento: primeiro temos de dar, para depois recebermos. Nyása e pújá passam muito pelo corpo emocional.
b) Mudrá
Mudrá significa gesto, selo ou senha. No yôga, mudrá designa os gestos reflexológicos, simbólicos e magnéticos feitos com as mãos.
Segundo Shivánanda, a presença de mudrá, pújá e mantra, caracteriza a herança dos Tantras. De notar que o Swásthya Yôga, de raízes tântricas, inicia a sua prática básica exactamente com essas três partes.
De acordo com o Mestre DeRose[xxv], ‘os mudrás actuam por associação neurológica e por condicionamento reflexológico. Não podemos negar um componente cultural, que reforça ou atenua o efeito dos mudrás. Sua influência na esfera hormonal é inegável. Um facto curioso e que só pode ser atribuído ao inconsciente colectivo é a ‘coincidência’ de que, em épocas diferentes, hemisférios diferentes, etnias e culturas diferentes, os mesmos gestos são observados com o mesmo significado. Os mudrás do hinduísmo são originários da antiga tradição tântrica e tanto o yôga como a dança clássica hindu – o Bhárata Natya – utilizam-os. Nos yôgas mais tardios essa arte ficou praticamente extinta, limitando-se a uns poucos mudrás.’[xxvi]
No tantrismo, também o mudrá está intimamente ligado ao nyása. Cada gesto conduz o praticante a estados específicos de consciência, permitindo-lhe entrar em contacto e identificar-se com todos os Mestres e demais discípulos que pertencem a uma mesma linhagem (por esse motivo não devemos, por exemplo, utilizar mudrás de outras escolas).
Existem mais de 100 mudrás de tradição tântrica, sendo os cinco mais conhecidos (e bastante utilizados nas práticas de Swásthya Yôga): Shiva mudrá, jñána mudrá, átman mudrá, pronam mudrá e trimurti mudrá.
c) Mantra
Mantra pode ser traduzido como vocalização. Compõe-se do radical man (pensar) + a partícula tra (instrumento). De acordo com o Mestre DeRose[xxvii] ‘é significativa tal construção semântica, já que o mantra é muito utilizado para se alcançar a ‘supressão da instabilidade da consciência’, denominada intuição linear ou… Meditação!’
Alguns mantras são constituídos por várias sílabas, palavras e notas musicais, sendo denominados kirtans, como por exemplo: o Shiva Mantra, Gáyatrí Mantra e Maha Mantra. Outros podem ter uma só palavra, uma só sílaba e uma só nota musical. Geralmente quando estes últimos são vocalizados repetidamente denominam-se de japa (repetição). Deverão pertencer a uma língua morta e, no caso do yôga, só serão válidos se fôr utilizado o idioma sânscrito.
As fórmulas mântricas mais potentes são aquelas que não possuem sentido literal, tradução ou significado e carregam uma força ancestral capaz de interferir no psiquismo humano e que, muito além disso, transformem a matéria em geral. A combinação dos sons é uma arte que foi desenvolvida, empiricamente, pelos Mestres de yôga da antiguidade, que viviam em contacto mais efectivo com a natureza. O mantra mais importante é o ÔM [xxviii].
d) Shuddhi
Shuddhi traduz-se como purificação. Pode ser externa e interna, segundo o tipo de escola que a adopte.
Uma purificação do tantrismo, é o chamado bhúta shuddhi que significa purificação dos elementos. Consiste em imaginar que, a partir dos tattwas mais densos, os mahabhútas, o elemento prithiví (terra) é absorvido por apas (água), depois em agni (fogo) que por sua vez é dissolvido em váyu (ar) e, a seguir no elemento menos denso, ákásha (éter). Depois dessas dissoluções, o praticante deverá intentar, num processo mental, a transcendência ao ahamkára (ego) até que, ultrapassando todos os tattwas da Prakriti, chegue à Shaktí.
O yôga desenvolveu e utiliza bhúta shuddhi: consiste na purificação das nadís (meridianos ou correntes por onde circula a bioenergia ou prána), através de técnicas como mantras, pránáyámas, kriyás, ásanas; mas também através de uma selecção alimentar e reeducação das emoções, para que o praticante não suje o seu corpo com detritos tóxicos de emoções viscosas, sentimentos como o ódio, a inveja, o ciúme, o medo, etc.
e) Dháraná e Dhyána
Dháraná significa concentração, e dhyána intuição linear (contemplação, meditação). A meditação é o estágio mais avançado da concentração. São técnicas puramente yôgis, sendo em determinadas circunstâncias utilizadas pelo tantra.
Um exemplo típico do tantrismo é o manidwípa, a meditação na ilha de pedras preciosas. Conforme descrição do Ghêranda Asmhitá – escritura tântrica da Idade Média – cap. VII, 2-8, deverá ser feita da seguinte forma: “O praticante deverá imaginar que há um grande oceano de néctar em seu próprio coração. E no centro dele há uma ilha de pedras preciosas, cuja areia está salpicada de brilhantes. Por todos os lados encontram-se árvores frondosas, carregadas de flores e frutos tenros. No meio do arvoredo deve imaginar uma enorme e antiga árvore com quatro ramos (representando os quatro Vêdas), e que está também carregada de flores e frutos. As abelhas zumbem e os pássaros cantam… Sob essa árvore deve ser visualizada uma pequena plataforma com um belo trono confeccionado com pedras preciosas. E sobre esse trono, está sentado o Ishtadêvatta, cujas formas, vestimentas, cores e adornos já haviam sido previamente descritos e ensinados pelo Mestre do praticante”.
O tantrismo é caracterizado também por um elemento chamado bhakti, que significa devoção. Bhakti está implícito na mãe-natureza, na medida em que alguém se sinta como seu filho; está inserido no infinito macrocosmos, conquanto se habite no finito microcosmos; ou pode ser representado como divindade pessoal (Íshwara), diante da impotência humana frente ao ciclo existencial.
O tantrismo utiliza imagens e formas mitológicas da tradição hindu, possibilitando ao praticante concentrar-se e meditar no seu objecto de reverência ou devoção. A partir do momento em que ele ultrapassa essa fase, ampliando ainda mais o dhyána, poderá alcançar um outro estado de consciência denominado samádhi.
f) Exercícios respiratórios tântricos
– Shiva-Shaktí pránáyáma – respiração de Shiva e sua consorte: os parceiros, de sexos opostos, sentam-se frente a frente em siddhásana com as mãos em átman mudrá; ambos aproximam suas narinas das do parceiro, sem tocar, e quando um expira o outro inspira seu alento; após algumas trocas de alento, deverão terminar com um mantra ÔM longo e reverência recíproca em prônam mudrá. Este exercício tem uma duração indeterminada.
– Tantrika pránáyáma – respiração para activar os chakras: os parceiros, de sexos opostos, sentam-se frente a frente em siddhásana com as mãos em prônam mudrá; ambos vocalizam três vezes o bíja mantra de cada chakra na ordem ascendente para estabelecer o ritmo do manasika bíja mantra que farão em seguida; atritam as palmas das mãos antes de cada chakra que vai ser energizado; após atritas as mãos, a esquerda mantém-se em contacto com a mão esquerda do parceiro; executam o chakra pránáyáma, ensinado anteriormente, aplicando a palma da mão direita na região do chakra correspondente ao bíja mantra que for mentalizado, atritando-o moderadamente; terminado o número de repetições do bíja mantra, passar para o chakra seguinte até o ájña chakra e, depois, retornar ao múládhára, repetindo várias vezes o processo; terminar com um mantra ÔM longo e reverência recíproca em prônam mudrá.
17. Yôga Tântrico, Yôga Brahmácharya, e a Kundaliní
Existem dois grupos opostos de yôga: o de linha tântrica e o de linha brahmácharya. Ambos afirmam que despertar a kundaliní é fundamental. Porém, apenas a linha tântrica utiliza o maithuna como alavanca de evolução, explorando a sensorialidade. A outra classe, praticada pela grande maioria dos yôgis na Índia, restringe o contacto sexual. Consequentemente, é anti-sensorial. O yôga de tendência brahmácharya encontra-se na segunda categoria.
O voto brahmácharya[xxix] ou celibato, como é comumente conhecido, geralmente é feito por monges que ostentam o título de swámis, aos quais estão proibidas as relações sexuais. A grande maioria dos estabelecimentos de yôga da Índia segue essa corrente. Nessas escolas, por exemplo, uma pessoa que não fez o voto brahmácharya, poderá até praticar algumas técnicas do yôga, mas se quiser de facto tornar-se um yôgi dessa linha, não poderá casar-se e se já tiver família terá de abandoná-la para morar no ashram.
Nos ashrams que possuem um padrão de vida brahmácharya não se utilizam alimentos que possam excitar o paladar e, consequentemente, o sexo – os livros de Shivánanda mencionam: ‘não olhe para as mulhes, nem sequer a foto ou imagem de uma mulher. Não fale sobre mulheres’[xxx] e ‘o alho e a cebola são piores que a carne’[xxxi]. Como são alimentos energizantes, estimulam o instinto sexual, que deve ser aniquilado, segundo o sistema brahmácharya.
Pelos motivos acima, o comportamento e a prática de um yôga de linha brahmácharya não pode ser confundido com o comportamento do yôga de linha tântrica. O processo e os resultados são completamente diferentes. Enquanto o yôga brahmácharya cultiva a evolução através do sofrimento e da repressão sensorial, o yôga tântrico conduz à evolução através do prazer e da liberdade.
Se tivermos em atenção que: na Índia cerca de um bilhão de pessoas seguem a tradição brahmácharya e apenas alguns milhares seguem o tantra; que, segundo Yôgánanda[xxxii], em cada mil pessoas que seguem o sistema brahmácharya, só uma consegue permanecer, e de cada mil que permanecem, apenas uma atinge a meta; e que ao tentarmos citar alguns Mestres de yôga hindus contemporâneos que tenham conseguido atingir a iluminação encontramos por exemplo, de linha tântrica, Ramakrishna e Aurobindo, e de linha brahmácharya cerca de quarenta Mestres; podemos concluir a linha tântrica tem mais sucesso no atingir da meta que a linha brahmácharya.
Apesar de serem sistemas opostos, os dois grupos de yôga valorizam a sexualidade, apesar de usarem metodologias divergentes: os brahmácharya consideram que se essa energia é tão sagrada não se pode desperdiçá-la mas deve-se antes poupá-la; os tântricos consideram que visto essa energia ser tão importante, deverá ser aprimorada e desenvolvida com mais intensidade (energia gera energia).
A sexualidade é condição fundamental no processo evolutivo do yôga. Kundaliní traduz-se por serpentina ou enroscada. É conhecida no tantrismo sob as mais diversas denominações: bhujangí, íshwarí, kundlí, kúlakundaliní, mahakundaliní, arundhatí, shaktí, etc. Segundo o Swásthya Yôga, kundaliní é uma energia física, de natureza neurológica e manifestação sexual.
Dentro da psicologia ocidental, os termos libido ou orgônio podem designar diferentes aspectos dessa energia. Visto essa energia estar associada ao sexo, existe alguma relutância na sua utilização por parte de indíviduos cuja herança cultural seja judaico-cristã, visto estar impregnada de culpa e pecado.
A kundaliní é de extrema importância na tradição hindu, tanto na corrente tântrica, que utiliza o sexo, quanto na corrente brahmácharya, celibatária. Usando a terminologia do shaktismo, kundaliní é a Shaktí individual que, como uma sepente de fogo, está enroscada três vezes e meia em torno do lingam (falo), na base da sushumná. E, estando em sono profundo, essa serpente poderá ser despertada através das técnicas yôgis, tais como pránáyáma, bandha, ásana, dhyána e outras técnicas ensinadas por um instrutor formado e competente.
O que conduz o praticante à evolução é a Shaktí kundaliní. O Mestre dá o impulso inicial para que o discípulo pratique e, finalmente, possa realizar a união tântrica Shaktí-Shiva no sahásrara chakra. Portanto, somente através das práticas é que o discípulo poderá activar sua energia latente, a kundaliní, que o conduzirá ao estado de samádhi.
Existem inúmeras maneiras de despertar e dinamizar essa força. De acordo com Sir John Woodroffe[xxxiii]: ‘Através das nádís idá e pingalá, a energia sai e entra pelas fossas nasais. Mediante kúmbhaka, o prána deixa de actuar sobre o ar atmosférico e retorna à envoltura vital, o múládhára chakra, produzindo aí uma acção fora do normal. Quando tal energia se potencializa, a consciência torna-se familiar com a Mãe-real, a kúlakundaliní. Despertada, ela ascende pela sushumná, podendo ir até o sahásrara chakra. Nesse local produz-se o néctar que o sádhaka absorve com prazer. Aumentando o tempo de kúmbhaka, aumenta-se a retenção da kundaliní na sushumná e, então, ela deve ser dirigida a cada chakra, unida ao Ishtadêváta correspondente, e na meditação dos Dêvatás, masculinos e femininos, eis que o praticante se converte em amo do dêváta de cada chakra e deixa de ser escravo para ser o senhor…’
Conforme pudémos constatar anteriormente, o tantrismo utiliza bastantes técnicas yôgis. O mantra, por exemplo, é enfatizado da seguinte forma no kularnava Tantra: ‘Alcançar o siddhi (poder) do mantra é impossível sem a prática do yôga’[xxxiv]. Assim, podemos dizer que o mantra é uma das técnicas que ajudam o despertamento da Shaktí kundaliní. E, como vimos, o trabalho com a kundaliní só é possível mediante as técnicas yôgis.
Shivánanda[xxxv] refere que nenhum samádhi é possível sem o despertar da kundaliní. Se considerarmos que, segundo Pátañjali (codificador do Yôga Clássico), a meta do yôga é o samádhi, concluimos que sem kundaliní não há yôga.
18. Transgressão e transcendência
A prática da transgressão é considerada um dos mais eficientes dispositivos psicológicos do tantra. Dado que vivemos em sociedade, e como tal estamos sujeitos a uma série de restrições que estabelecem limites cumulativos, desde os primeiros meses de idade por toda a vida, o facto de se transgredirem algumas normas tem um poderoso efeito de catarse (bastante utilizado em determinadas linhas da psicoterapia). Evidentemente – dado vivermos em sociedade – não é possível suprimir essas restrições (as normas, leis e regulamentos). No entanto, as restrições sucessivas e compulsórias acabam por gerar efeitos colaterais nem sempre desejáveis, pelo que, nesses casos, o facto de se transgredir algumas normas poderá ter um efeito desrepressor ou profilático para evitar certos problemas emocionais, por vezes graves, e dispendiosos no caso de requererem assistência terapêutica.
Quando se comprime energia, ela torna-se perigosa e tende a explodir. Experimente por exemplo, colocar um pouco de pólvora sobre uma superfície deite-lhe fogo; ela fará ‘puff’ e provavelmente não magoará ninguém. Experimente depois colocar a mesma quantidade de pólvora dentro de uma cápsula de metal vedada; ao ser detonado o explosivo fará ‘bang’ e poderá matar alguém. Quando as repressões ultrapassam o limite de resistência de uma pessoa, ela explode. Essa explosão pode ser para o lado do corpo, na forma da somatização de alguma enfermidade física (autodestruição); ou pode ser para o lado do psiquismo, elaborando intrincadas estruturas de comportamento anti-social (heterodestruição). É aí que surgem os criminosos comuns e, em caso mais complexos, os psicopatas. Não significa que a prática da transgressão possa evitar todos os casos de criminalidade ou psicopatologia, mas poderá atenuar muitos casos.
Quando alguém pisa o pé de um brahmácharya típico, ele tende a não reagir, pensa: ‘o meu irmão não está a fazer de propósito, ele não está a perceber que me está a magoar. E eu faço yôga, portanto devo-me controlar ao invés de reclamar. Ele vai perceber que me está a pisar e vai tirar o pé.’ Entretanto a situação prolonga-se, o pé continua a doer cada vez mais, e o brahmácharya vai ‘enchendo’ até que pensa: ‘Sinceramente, será que esse imbecil não vê que me está a pisar?’. Quando finalmente toma uma atitude, a reação costuma ser mais agressiva e até neurótica. Quando alguém pisa o pé de um tântrico autêntico, ele diz de imediato: ‘Ei! O de baixo é meu!’ e a situação resolve-se nesse mesmo instante. Como não houve repressão, não ocorre explosão, nem para dentro, nem para fora. A energia emocional escoa naturalmente.
Uma vez que o tantra é uma filosofia não repressora, em que se priveligia a liberdade, elaborou há muitos séculos um recurso que consiste em, conscientemente e sob o controle de um especialista, arquitetar circunstâncias inócuas em que as normas sociais possam ser transgredidas sem prejuízo de ninguém e sem que isso caracterize uma acção ilegal, isto no caso da linha branca. A linha negra também utiliza esta técnica – transgressão – mas adoptou atitudes socialmente escandalosas ou ilegais.
Existem muitas formas de transgredir sem infrigir leis jurídicas. Como por exemplo: o funcionário dizer não ao chefe intransigente; o jovem reagir e tomar uma atitude revolucionária relativamente aos costumes da família após ter seguido ordens e restrições dos pais durante toda a sua vida; a pessoa que abandona a faculdade que não lhe trazia satisfação pessoal, ou troca de carreira profissional; quando se adopta uma moral diferente da que é praticada pela sociedade onde se vive, etc. O tantra é, por excelência, a arte de assumir uma moral distinta da utilizada pela maioria. Tornar-se vegetariano é um bom exemplo de contestação por uma boa causa. Além de não prejudicar ninguém ou ser ilegal, essa transgressão alimentar ainda beneficia a saúde e tem um louvável componente ético.
19. Nota sobre discrepâncias históricas
Visto o período proto-histórico indiano não possuir registo – baseia-se apenas na arqueologia, tradições orais e deduções construídas por historiadores, antropólogos e outros cientistas – existem duas versões principais para essa época, e algumas outras variantes com menos importância.
O SwáSthya Yôga adoptou uma das principais versões, por se tratar da que conta com mais e melhor literatura de apoio documental (o que não significa que seja a versão verdadeira). Essa versão afirma que os drávidas viviam na Índia há mais de 3.000 a.n.e., e que sub-bárbaros guerreiros da etnia ariana invadiram o seu território, destruiram as suas cidades, mataram e escravizaram, principalmente por volta do ano 1.500 a.n.e., o que os teria obrigado a migrar para o Sul da Índia e para o Srí Lanka. De acordo com esta versão, seria fácil perceber o motivo pelo qual os drávidas são muito mais numerosos no Sul da Índia e no país vizinho, Srí Lanka. Faz sentido ainda no que concerne à tradição guerreira dos arianos, ancestrais dos alemães, proverbiais senhores da guerra e inventores das mais eficientes armas desde a antiguidade; ou na tendência dos arianos de pregar a hegemonia da sua raça em detrimento das demais, e de cometer genocídios para ‘depurar’ a espécie humana, eliminando sumariamente os de raças consideradas inferiores. Conforme foi já mencionado, este facto poderá ser explicado de acordo com a genética: os arianos, de pele clara, olhos azuis e cabelos louros, têm genes recessivos, enquanto que os de pele, cabelos e olhos mais escuros são geneticamente dominantes. Num cruzamento entre os arianos e a maior parte das demais raças, a descendência teria as características das outras etnias, o que levaria ao extermínio da raça ariana. Sendo bastante mais fracos em termos genéticos, é compreensível por que ao longo de milhares de anos, quiseram sistematicamente eliminar os demais – tratava-se de uma questão de sobrevivência. – A tendência à guerra e a dominar outros povos está inclusive expressa nos Vêdas, escritura sagrada ariana, no verso que declara as intenções dos arianos daquela época: “Com o arco venceremos nossos inimigos e conquistaremos toda a Terra.”
Existe uma outra versão (defendida pelos arianos) que tem vindo a ganhar adeptos: a de que os arianos não migraram da Europa Central para a Índia em vagas de invasões que culminaram com a destruição da já enfraquecida civilização do Vale do Indo. De acordo com esta versão, os arianos estavam na Índia há mais de seis mil anos a.n.e. Academicamente, é difícil sustentar esta afirmação, no entanto, se ela for verdadeira, os arianos já se encontravam lá quando o Yôga, o Sámkhya e o Tantra surgiram. Segundo essa interpretação, não foram os arianos que destruíram a civilização Harapiana; ela ter-se-ía deteriorado por si só e entrado em colapso por vários motivos, entre eles o desaparecimento de um importante rio, o Saraswatí.
Há ainda uma terceira opinião bastante difundida em França, segundo a qual o yôga teria sido criado pelos Celtas em França, e levado para a Índia. Defendem ainda que o sânscrito não deve ser chamado de língua indo-européia e sim euro-indiana, porquanto teria sido levada da Europa para a Índia.
Para o Swásthya Yôga, o importante é o yôga em si: as técnicas, a prova de que funcionam e a meta é atingida. O cuidado vai no sentido de manter um yôga original fiel aos seus princípios. Seja qual for a verdade histórica, isso não altera a forma da execução dos mantras, dos ásanas, dos pújás ou da meditação. Yôga é a técnica. Obviamente a história poderá dar um contributo importante para a compreensão e fundamentação de conceitos e princípios do Swásthya Yôga, mas na realidade o que interessa é o yôga em si, e não o facto de poder ter surgido nesta ou naquela civilização, neste ou naquele ano. O Swásthya Yôga limita-se a ler e expor os resultados das pesquisas de terceiros no campo da História e da Arquelogia.
20. Tantra Yôga
Tantra yôga: é o yoga sensorial. Utiliza técnicas sensoriais que trabalham as energias subtis do nosso plano físico, dirigindo-as aos centros energéticos responsáveis por estados de elevação da consiência.
Mas com fundamenação tantrika há ainda outras escolas, como:
– Urdhawaratus yôga (yôga do sexo)
– Panamerita yôga (felicidade universal)
– Hatha yôga (yôga da violência)
21. Káma Sútra
Ao contrário do que se possa pensar, o Káma Sútra não tem nada a ver com o tantra. O livro Káma Sútra é um tratado de etiqueta sexual encomendado pelo Marajá ao sábio Vatsysyána para educação dos seus filhos. É provável que o verdadeiro texto do Káma Sútra seja bastante diferente da maior parte das traduções publicadas no mercado. O seu conteúdo não apresenta técnicas tântricas ou expõe os princípios ou propostas dessa filosofia comportamental.
22. Conclusão
Tantra, ou tantrica, é pois uma filosofia comportamental. Um modo de vida. Independentemente de uma pessoa ter ou não iniciação tântrica, pode-se dizer se é tântrica pelo seu modo de vida, pelo seu comportamento, modo de agir. É ainda mais notório tendo o tantra características matriarcais, e sendo a maioria das sociadades actualmente patriarcais.
Não obstante as suas origens, onde ou como surgiu, o importante é o tantra em si. As suas características, práticas, o seu mecanismo, o seu objectivo. Apesar das diferentes linhas e escolas existentes, em todas elas se observam as principais características, método e o objectivo do tantra.
É também possível verificar o quão intimamente ligados estão o tantra e o Swásthya Yôga no caminho do autoconhecimento e evolução interior. Inclusivamente em práticas utilizadas, como o pújá, mudrá, mantra, shuddhi, dháraná e dhyána, e pránáyáma.
Muito fica por dizer acerca do tantra. No entanto, o principal deverá ter sido aqui apreendido.
23. Bibliografia
– Autobiografia; Swámi Sivananda; Editora Pensamento
– Documentação Curso de Formação de Instrutores de Yôga; 2005 – 2006
– Faça Yôga antes que você precise; Mestre DeRose
– Hiper Orgasmo, uma via tântrica; Mestre DeRose; Martin Claret
– Kundaliní Yôga; Shivánanda
– Princípios del Tantra; Sir Jonh Woodroffe; Kier
– Sanskrit-English Dictionary; Monier Williams; Oxford University
– Tantra Yôga, Nada Yôga, Kriyá Yôga; Swámi Sivánanda; Editorial Kier
– Tantra, el culto de lo feminino; Van Lysebeth
– Yôga Mitos e Verdades; Mestre DeRose; Nobel
– Yôga Review, ano 1, nº2; Mestre DeRose
– Yôga, Sámkhya e Tantra; Mestre Sérgio Santos; Uni-Yôga
– Yôga. Immortalidad y Liberdad; Mircéa Éliade
Notas:
[i] Yôga, Sámkhya e Tantra; Mestre Sérgio Santos; Uni-Yôga; pág. 79
[ii] Tantra Yôga, Nada Yôga, Kriyá Yôga; Swámi Sivánanda; Editorial Kier; pág. 25
[iii] Patañjali e o Yoga; Mircéa Eliade; Relógio D’Água; pág.180
[iv] Yôga, Sámkhya e Tantra; Mestre Sérgio Santos; Uni-Yôga; pág. 80
[v] Yôga, Mitos e Verdades; Mestre DeRose; Uni-Yôga; pág. 122
[vi] Antes da nossa Era
[vii] Depois da nossa Era
[viii] Yôga, Mitos e Verdades; Mestre DeRose; Uni-Yôga; pág. 123
[ix] Autobiografia; Swámi Sivananda; Editora Pensamento; pág. 140
[x] Shastras são as escrituras incorporadas ao património do hinduísmo. Nos shastras, além dos tantras, existem os Vêdas, as Gítás, os Sútras, as Upanishades, os Puránas, e outros. São uma excelente fonte de pesquisa, pois muitos deles sofreram pouquíssimas modificações ao longo dos séculos.
[xi] Princípios del Tantra; Sir John Woodroffe; Kier; pág. 31
[xii] Yôga. Immortalidad y Liberdad; Mircéa Éliade; pág. 331
[xiii] Kundaliní Yôga; Shivánanda; pág. 25
[xiv] Yôga, Sámkhya e Tantra; Mestre Sérgio Santos; Uni-Yôga; pág. 84
[xv] Yôga, Sámkhya e Tantra; Mestre Sérgio Santos; Uni-Yôga; pág. 84
[xvi] Tantra, el Culto de lo Feminino; Van Lysebeth; pág. 73
[xvii] Yôga, Sámkhya e Tantra; Mestre Sérgio Santos; Uni-Yôga; pág. 87
[xviii] The Tantric Way; Ajit Mookerjee/Mashu Khanna; Thames & Hudson; pág. 28
[xix] The Tantric Way; Ajit Mookerjee/Mashu Khanna; Thames & Hudson; pág. 28
[xx] Hiper Orgasmo, uma via tântrica; Mestre DeRose; Martin Claret/Uni-Yôga; pág. 22
[xxi] Patañjali e o Yoga; Mircéa Eliade; Relóiio D’Água; pág. 186
[xxii] Yôga, Sámkhya e Tantra; Mestre Sérgio Santos; Uni-Yôga; pág. 91
[xxiii] Yôga, Sámkhya e Tantra; Mestre Sérgio Santos; Uni-Yôga; pág. 90
[xxiv] Yôga, Sámkhya e Tantra; Mestre Sérgio Santos; Uni-Yôga; pág. 97
[xxv] Faça Yôga Antes Que Você Precise; Mestre DeRose; pág. 104
[xxvi] Yôga, Sámkhya e Tantra; Mestre Sérgio Santos; Uni-Yôga; pág. 98
[xxvii] Faça Yôga Antes Que Você Precise; Mestre DeRose; pág. 136
[xxviii] Yôga, Sámkhya e Tantra; Mestre Sérgio Santos; Uni-Yôga; pág.99
[xxix] Acharya significa servidor e instrutor. Brahmácharya quer dizer servidor de Brahma. Através dos milénios, o termo brahmácharya passou a significar, também, celibato.
[xxx] Kundalini Yôga; Sri Swami Sivananda; Kier; pág. 220; 2ª edição – Buenos Aires 2003
[xxxi] Kundalini Yôga; Sri Swami Sivananda; Kier; pág. 75; 2ª edição – Buenos Aires 2003
[xxxii] Apud Meste Sérgio Santos, em Yôga, Sámkhya e Tantra, pág. 106
[xxxiii] Princípios del Tantra; Sir John Woodroffe; Kier; pág. 502 , 503
[xxxiv] Yôga, Sámkhya e Tantra; Mestre Sérgio Santos; Uni-Yôga, pág. 108
[xxxv] Kundaliní Yôga; Shivánanda; Pág. 35, 81
Anabela Duarte da Silva
Trabalho apresentado para o Exame de Candidatura a Yogachárya