Meus queridos
Deixo-vos algumas anotações sobre os mudrá que usam na coreografia Dêva Mandira.
Samputa mudrá. Este mudrá é o que, da vossa coreografia colectiva, pretendo relacionar com o que vos disse, há uns dias atr, sobre a caixa. É o gesto da caixa fechada, ou do cofre. Como tal, símbolo feminino, do inconsciente (recordam-se da Esperança?), ou do útero. Simboliza um segredo que nele está contido. Por outro lado, o útero, a caixa, o cofre, não têm valor por si mesmo, mas sim pelo seu eventual conteúdo. É símbolo, este mudrá, dos tesouros da liberdade, da sabedoria e da imortalidade, cujo guardião é Kuvêra.
Este mudrá é também utilizado para fazer pújá.
Alguns outros mudrá que usam na V. coreografia, comentá-los-ei seguidamente:
Durgá mudrá. Durgá, deusa, a inatingível, é uma shaktí, manifestação da energia primordial. É uma das mais poderosas e temíveis manifestações de energia de Shiva. A sua antiguidade no Tantra e no Yôga é inegável. Eliade refere que entre os drávida já se representava, no culto da Deusa-Mãe, a entidade Kálí-Durgá. Durgá é também a montanha.
Ardha Súrya mudrá. Este é o gesto do sol nascente (savitura), do sol que nasce sobre as águas. Simboliza sempre um início, nascimento, crescimento, evolução. Faz com que o arquétipo do sol, como grande dispensador de vida, vibre em todos os nossos corpos e na nossa psique. Faz-nos vibrar no cumprimento de onda dos atributos da vida, da força geradora, criadora, do poder e da iluminação.
Alapadma mudrá. Para comporem o ardha Súrya mudrá, uma das mãos faz alapadma mudrá, que simboliza a flor do lótus totalmente aberta. Diz-se ser o mudrá dos mestres. Pois esta flor representa a perfeição da beleza e da simetria. Assim como a pureza, pois as suas raízes transmutam a podridão do fundo do lago, na pureza das pétalas da flor. E se as águas subirem, a flor sobe com elas, mantendo-se sempre limpa. O lótus branco e o rosa representam a prosperidade e harmonia. É um símbolo solar. Já o lótus azul, uptala é um símbolo shivaísta e lunar, representando a criação, a abundância, a beleza, o prazer estético, o movimento.
Swástika mudrá. É o gesto auspicioso, mas também representa a encruzilhada. Representa a expansão do mundo através do vórtice primordial, o movimento circular sobre um eixo. Também está associado ao machado e ao labirinto. Os celtas representavam a swástica de modo estilizado, parecendo um labirinto. Ora, como ensina Daniélou, o labirinto sempre evoca os mistérios da iniciatórios, os caminhos desviantes que conduzem à iluminação. “O Ser que percorre o labirinto… chega finalmente a encontrar o ‘lugar central’, ou seja, do ponto de vista da realização iniciática, seu próprio centro… Se consideramos o caso em que o labirinto está em conexão com a caverna, esta, que ele cerca com suas sinuosidades e à qual por fim, chega, ocupa pela mesma razão, no conjunto assim constituído, o ponto mais interior e central, o que corresponde à ideia do centro espiritual e que concorda igualmente com o simbolismo equivalente do coração (René Guénon, Symboles fondamentaux de la science sacrée, pp. 216 e 392)., in Shiva e Dionísio, p. 106.
SwáSthya
(C)Copyright, João Camacho, Yôgachárya
“Sou irmão de dragões e companheiro de corujas.”
Azeitão, 12 de Junho de 2007