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A Civilização do Vale do Indo |
Por: Júlio Hugo Da Silva Pashupati: o Senhor dos Animais
Sumário Características Sócio-Culturais Extinção: invasões ou causas naturais? Introdução
É apresentada neste trabalho, de forma resumida, a antiga civilização do Vale do Indo, hoje mais comummente conhecida por civilização Harappiana. Será apresentado um contexto histórico que permita situar o momento em que se desenvolveu esta civilização, as suas características sociais, económicas e culturais. Tudo isto será feito recorrendo ao que de mais recente se pode concluir e afirmar pelos factos disponibilizados pelas mais recentes investigações em curso nas escavações arqueológicas naquela região e pelos estudos efectuados nas escrituras antigas do Hinduísmo. Será também feita uma breve análise sobre as várias teorias que tentam explicar o desaparecimento ainda envolto em mistério desta civilização. É também o objectivo deste trabalho tentar trazer o maior número de ideias de diferentes escolas de investigação sobre esta cultura e estes tempos, que permita de forma breve coligir a ideia geral por detrás desta civilização e das diferentes interpretações possíveis e existentes actualmente sobre a mesma. Esta foi uma civilização relacionada com as origens do Yôga, pois encontraram-se vários vestígios arqueológicos que demonstram que este povo era shivaísta (Shiva – o criador do Yôga), como são os casos de selos com a figura de Pashupati, o senhor dos animais. Procurar-se-á sempre que possível mostrar a ligação entre esta civilização e as origens do Yôga, mais concretamente ao Swásthya Yôga, sistematização do Yôga Antigo, o Yôga Ultra-Integral, de raízes muito antigas, Dakshinacharatántrika-Niríshwarasámkhya Yôga. O Swásthya Yôga é um Yôga de linha Tantra, ou seja, matriarcal, sensorial e desrepressor, e também de tendência Sámkhya. É assim de linha e tendência Tantra-Sámkhya por oposição a Brahmácharya-Vêdanta, esta última, a dominante actualmente na Índia (existindo mais recentemente modas de Tantra-Vêdanta). Sendo esta última linha-tendência a dominante na Índia actual, no entanto nem sempre foi assim. Há milhares de anos, no período entre o final do Paleolítico, a Revolução Neolítica e o início das Eras dos metais, os territórios que hoje constituem a Índia e o Paquistão, foram habitados por uma civilização muito especial.
Quadro 1 – Troncos de yôga associados a um período histórico – Mestre DeRose. Período Histórico
Do Paleolítico à Era dos metais, passando pela Revolução Neolítica
Como afirma Sir Mortimer Wheeler, em [1], página 9: “Civilization, in a minimum sense of term, is the art of living in towns, with all that the condition implies in respect of social skills and discipline”. Quando caracterizamos uma civilização estamos necessariamente a falar de sedentarismo, de um povo que já tem por característica fixar-se por um largo período de tempo numa determinada região. Esta definição pressupõe que quando falamos de uma civilização estamos a falar de um estado de desenvolvimento do ser humano caracterizado por ter passado a ser maioritariamente sedentarista, e só muito ocasionalmente ter comportamentos nómadas, motivados principalmente por trocas comerciais, no caso de povos não-violentos.
Fig 1 e 2– Do lado esquerdo fotografia das ruínas do celeiro de Harappa, e do lado direito um desenho faz a sua reconstrução. Fonte: Sir Mortimer Wheeler em [1] Segundo o professor José Hermano Saraiva ao descrever o período neolítico, “O famoso arqueólogo Gordon Childe usou, com mais êxito, a expressão revolução neolítica, para pôr em relevo o carácter decisivo das modificações. De facto, é então que se inicia a substituição da vida nómada pela vida sedentária, e também parece começar então a luta do Homem para vencer e pôr à sua mercê as forças produtivas da Natureza. Dir-se-ia que na mente humana surgiram capacidades novas: a previsão do tempo futuro e a planificação. Na fase anterior (Paleolítico), o Homem, como os outros animais, estava inteiramente dependente, do mundo natural. Mas agora ergue-se contra ele, e aparece animado pela ambição de moldar um mundo para si: constrói a sua cidade, cria o seu rebanho, premedita a sua sementeira. A partir de agora vão surgir, como grandes condicionantes da vida humana, a economia, a cidade e a lei.”, em [2], página 19. É no entanto importante referir que no Paleolítico Superior se encontram vestígios daquilo que actualmente relacionamos com a cultura de onde vem o Yôga, ou seja, e mais precisamente, diz-nos por exemplo Pierre Levêque, que de um manancial de vestígios de obras de arte e pintura desses tempos, que vão desde as pinturas nas cavernas até estátuas de pedra e osso, duas grandes direcções estão abertas à investigação: “animais que não são os da floresta, os da caça quotidiana, mas como que as suas hipóstases, potências reguladoras da caça e dispensadoras das energias da floresta, e por outro lado, mulheres que são também seres sobrenaturais, deusas. Entre estes dois sectores existem interligações que restabelecem a unidade do universo, por exemplo, hierogamias das Mães de fecundidade com grandes cornudos, primeiro aparecimento de um tema que não cessará de fecundar a imaginação religiosa através do Neolítico e do Bronze, até à Grécia das cidades.”, em [11], páginas 15 e 14. É muito tentador encontrar aqui a dualidade Shiva-Shakti, os animais e o cornudo, que apontam para Pashupati, Shiva, e a deusa que aponta para Shaktí. Mas isso veremos mais adiante. Fig 3 – Figura feminina nua, apenas usando um colar, em pose sensual e descontraída, impossível em sociedades patriarcais. Fonte: Sir Mortimer Wheeler em [6] Este período Neolítico distingue-se em fases autónomas: antigo, médio e final. Em Portugal o Neolítico Médio e Neolítico Final correspondem a um intervalo de tempo entre 3800 a.C. e 2500 a.C.. Posterior a este período segue-se o Megalítico (do grego mega, «grande» e lithos, «pedra»), caracterizado pelos menires, cromeleques e os alinhamentos de blocos de pedras. A partir daqui dá-se o início da Era dos metais, onde se sabe que “Ao início da metalurgia em Portugal anda ligada a teoria do colonialismo calcolítico egeu, segundo esta interpretação vieram do mediterrâneo oriental (Anatólia, mar Egeu, Egipto, Mesopotâmia) exploradores de cobre, metal que entretanto se tornara muito procurado naquelas regiões que estavam em plena época do bronze, liga em cuja composição o cobre era indispensável.”, em [2], página 22. Temos assim o fim do Paleolítico, seguido do início do Neolítico, posteriormente o Megalítico, e as sucessivas Eras dos metais, começando no cobre, bronze e o ferro. Em relação ao ferro, posterior ao bronze, temos que “O seu uso mais antigo aparece documentado na Anatólia, nos meados do II milénio a.C. ”, em [2], página 25. Diz-nos ainda Sir Mortimer Wheeler que “In the fourth and third millennia, the Iranian plateau, riven by sharp uplands and tumbling steeply to the flanking riverine plains of the Tigris-Euphrates and the Indus, was the home of a multitude of disparate societies, essentially neolithic but verging gradually upon a stone-bronze (or chalcolithic) technology”, em [1], página 12. As escavações das cidades Mohenjo-Daro e Harappa, juntamente com mais umas dezenas de outros locais de escavações, todos atribuídos à civilização do Vale do Indo, pelas semelhanças das descobertas muito comuns entre esses locais, apresentam uma civilização com traços de final do neolítico, com toques de megalítico e início de idade do bronze. Pode-se também apelidar de cultura calcolítica, ou como refere Sir Mortimer Wheeler “[…] an alternative label, ‘Protometallic’, is scarcely more elegant or exact.”, em [6], página 93. Fig 4 – A utilização do rio como meio de transporte, e o armazenamento dos cereais em celeiros, sinais de sedentarização e início das civilizações. O facto de se estar a mencionar Portugal ao mesmo tempo que se tenta caracterizar a civilização do Vale do Indo, prende-se com o facto de o autor deste texto ser português, praticante de Swásthya Yôga, mas mais importante para o contexto deste trabalho, por se saber que existem vestígios das civilizações destes períodos em Portugal pois eram civilizações que embora sediadas em determinadas regiões, se espalharam pelo mundo mediterrânico, através do comércio e de migrações não violentas. “Gracias al clima mediterráneo y del Oriente Próximo, la agricultura, y por tanto la sedentarización y la civilización, pudieron desarrollarse. Este es el verdadero factor civilizador.”, como nos explica André Van Lysebeth, em [3], página 30. É assim nesta época de transição entre o neolítico e a Era dos metais que surgem as primeiras e mais antigas civilizações. A Suméria, o Egipto, a Mesopotâmia, entre elas a civilização Harappiana, que ao longo dos tempos vão influenciar uma vasta região desde o Vale do Indo até à Europa mediterrânica e o norte de África. Diz-nos Alain Daniélou que foi durante a Era Neolítica que apareceu uma nova raça entre os Mundas na Índia. Eles tinham pele castanha, cabelo liso, e falavam uma linguagem imperceptível. Segundo Sir Mortimer Wheeler e com base em datações por Carbono 14 feitas às escavações, tudo aponta para um período mais concreto entre 2300-1750 a.C. como o intervalo de tempo em que estas cidades foram criadas e se desenvolveram. E existem vestígios de contactos das tribos que habitavam estas cidades com as antigas e proto-históricas civilizações da Mesopotâmia, Anatólia, Egipto e Aegean. Existem provas de contacto com Sargão da Akkadia (2370-2284 a.C), e com King Urnammu (2100 a.C), e de qualquer das formas Mohenjo-Daro já existia muito antes destes vestígios. Objectos de Mohenjo-Daro foram encontrados em Tel Asmar e Tróia (2300 a.C), assim como também num túmulo real em Ur. Sir Mortimer Wheeler divide a existência desta civilização em várias fases. A primeira inicia-se em 2500 a.C. quando ideias sociais e de consciência cívica que germinaram na Mesopotâmia foram fertilizar as tribos e comunidades da fronteira Baluch-Indu, que produziu a civilização do Vale do Indo. Por volta de 2000 a.C. esta civilização já dominava do Vale do Indo até às costas ocidentais de Makran no norte do Golfo de Cambay. Pouco antes da metade do segundo milénio, por volta de 1700 a.C., iniciou-se um declínio, estimulado talvez por alterações geomorfológicas e inundações periódicas, que prepararam de certa forma para um final com vestígios de invasões violentas. Se os invasores eram os arianos que os hinos vêdicos descrevem sem sombra de dúvida ou se foram outros quaiquer invasores, ou resultado de guerras internas, são tudo conjecturas, mas um certo paralelismo pode ser feito entre os registos de invasões arianas e as evidências arqueológicas em Mohenjo-Daro. Fig 5 – Península Indo-Asiática. Fonte: Sir M. Wheeler em [1] A segunda fase está relacionada com as regiões para Sul e Este da região da primeira fase, perto das costas de Kathiawad (Saurashtra). Aqui a já madura civilização do Vale do Indo ou civilização Harappiana estava transmutada para uma era calcolítica, com pequenas cidades, que mostram ligações e semelhanças com cidades do centro da Índia no segundo milénio. Caracterizada pelo desenvolvimento de indústria do ferro e com estilo de vida urbano, que aparece no início da primeira metade do segundo milénio. Aqui floresceu a segunda fase da civilização indiana, para a qual se utilizava o nome de Civilização do Ganges. Esta fase marca o início do uso do ferro, tijolos cozidos em vez de tijolos de lama, desenvolvimento urbano, que durará aproximadamente até 500 a.C. A terceira fase está relacionada com o propagar da civilização do Ganges para a Índia Central, no vale de Narbada, o final da influência Persa e início do império Mauryan, estabelecendo-se corredores seguros até aos portos ocidentais, este sentimento de segurança e confiança pode ser interpretado como resultado do florescer do intelecto e do espírito que encontrou expressão no crescimento do Budismo e do Jainismo. A quarta e última fase decorre até ao primeiro século a.C. e caracteriza-se pela expansão do império Mauryan para o sul cobrindo toda a Península Indiana pelo menos até ao rio Khrisna na região de Amaravati. Estas quatro fases resultam de provas arqueológicas existentes que permitem documentar um período que vai de 3000 a.C. até quase ao início da nossa Era. Os Persas estiveram no noroeste da Índia entre 500-300 a.C., posteriormente um jovem príncipe criou o Império Mauna, e Ashoka, seu neto, foi o governante que mais marcou a Índia antiga. Nos séculos seguintes, formaram-se vários reinos, todos independentes, e com características culturais e linguísticas diferentes. Características Sócio-CulturaisO contexto político-organizativo em que esta civilização existiu é ligeiramente diferente das suas civilizações contemporâneas, poderá assim ser considerado não como regiões-estados-impérios, como era o caso do Egipto, mas mais numa dimensão de cidades-estado como nos diz João Ferreira do Amaral: “Um segundo tipo de unidades políticas eram as cidades-estado mais ou menos independentes, algumas vezes integradas em impérios […] Na Índia estava em pleno florescimento e já desde a metade do terceiro milénio a.C., a civilização urbana do Indo, de que os locais mais emblemáticos são Harappa e Mohenjo-Daro, estabelecendo contactos comerciais intensos com a Suméria (os sumérios designavam a região por Melukhkha), e recebendo delas influências directas. Usava uma escrita hieroglífica, ainda não decifrada e entrou em decadência no século XVIII a.C., desaparecendo progressivamente por essa altura.”, em [5], página 17. Estas trocas comerciais são também defendidas por Pierre Lévêque que mostra que os Sumérios faziam comércio longínquo com o Egipto ou com as regiões do Indo para aquisições de metais e pedras preciosas. Fig 6 – Civilizações do 3º Milénio. Fonte: João Ferreira do Amaral em [5] Esta civilização do Vale do Indo é portanto contemporânea dos impérios do Egipto, Mesopotâmia, e da Suméria, apresentando uma estrutura social tendo no topo um género de rei e ou sacerdote, pelo menos é o que se interpreta das citadelas descobertas (edifícios elevados sobre a cidade) onde habitava um género de juiz ou regulador municipal. A maioria das cidades apresentam sinais de serem habitadas por uma classe-média próspera, organizada sob o controlo de uma estrutura municipal, fruto de uma aparente consciência cívica. A arquitectura destas cidades revelam um dos mais antigos exemplos de planeamento citadino, com desenho geométrico de ruas, as quais são largas orientadas de sul para norte, com ângulos rectos entre ruas, com blocos de casas em “grelha” orientados no sentido dos pontos cardinais. As casas geralmente tinham divisões amplas, que englobavam quartos, jardim, terraço, quarto de banhos. Eram cidades com sistema de esgotos e canalização dentro das casas com ligações a uma rede pública de saneamento, o que faz inveja a muitas zonas actuais do planeta. Fig 7 – Harappa, Fonte: Sir Mortimer Wheeler em [1] Foram encontrados nas cidades escavadas alguns cemitérios, com os corpos posicionados de norte para sul com a cabeça para norte. Foram encontradas estátuas com representações da Deusa-Mãe, e foram também encontradas estátuas de uma figura masculina que parece a de um sacerdote ou religioso superior, ou rei. Existem vestígios de adoração da Deusa-Mãe, e outros que sugerem a adoração do touro, dos cornos, do falo. Foram encontrados pilares de pedra preta (adoração ao falo de Shiva como princípio criativo). Estas são as mais antigas formas de adoração, mostrando rituais ainda simples, que depois foram substituídos pelos rituais dos brâmanes que passaram a ter exclusividade neste papel.
Fig 8 – Mohenjo-Daro, Fonte: Sir Mortimer Wheeler em [1] Temos portanto num mesmo local vestígios de uma sociedade que adora a natureza, o falo, a yôni, tipicamente animista, misturada com vestígios de entidades superiores como sacerdotes ou reis. Este sacerdote ou rei pode ser muita coisa ou coisa nenhuma. Ou seja, pode de facto simbolizar alguma figura da sociedade pós-dravidiana, já numa estrutura patriarcal, um sacerdote vêdánta, ou poderá tão simplesmente ser uma homenagem a alguém importante, mesmo que fosse num tempo ainda dravidiano. Os aposentos que se atribuem aos padres, os santuários vêdánta num mesmo local em que existem estes vestígios de paganismo, animismo, comprovam a existência de duas estruturas religiosas diferentes ao mesmo tempo, uma mais ligada a sociedade matriarcal e outra a sociedade patriarcal, pelo que algures no tempo existiu aqui uma junção, uma existência conjunta destas duas formas, dravidiana por um lado e ariana por outro. Fig 9 – Padre, Rei ou Divindade, Mohenjo-Daro. Fonte: Sir Wheeler em [1] Nestas civilizações do neolítico até à idade do bronze, e pouco depois, as famílias desempenham um papel importante na comunidade. Como nos diz Pierre Levêque no paleolítico os casais formam-se por adesão ou rapto e são facilmente dissociáveis, mas na aldeia neolítica temos o casal estável sob a autoridade do, ou da, chefe de família. Nestes tempos de revolução neolítica verifica-se que as formas ideológicas evolvem fortemente, no entanto a Mãe de fecundidade estende doravante a sua protecção não aos nómadas mas aos agricultores, tornando-se também mãe da fertilidade, ao mesmo tempo que os seus poderes sobre os mortos são ainda mais evidenciados. Verifica-se um aumento de estatuetas das deusas nos santuários e nos celeiros das aldeias, fixando-se um mundo sobrenatural estável organizado à volta destas Grandes Deusas (também denominadas de Terras-Mães): “promotoras indissoluvelmente de fertilidade/fecundidade/vida eterna. Estrutura que vai enformar o pensamento religioso durante milénios à volta da prepotência de uma Mãe, acompanhada dos seus filhos, e de um paredro masculino muito nitidamente dominado por ela e que apresenta muitas vezes com forma de animal (touro, carneiro, ave…)”, em [11], páginas 18 e 19. Aqui claramente vestígios de uma cultura matriarcal, uma das evidências da filosofia comportamental, Tantra, característica do nosso Yôga, o Swásthya Yôga. Fig 10 – Duas reconstruções que ilustram o Grande Balneário de Mohenjo-daro, nas suas duas fases, os edifícios a norte são quartos com balneários privados, possivelmente para padres. Fonte: Sir Mortimer Wheeler em [1] Eram também as mulheres que realizavam e dominavam a maior parte dos rituais, claro que os homens também os podiam realizar. Os textos da Suméria e Mesopotâmia “… apresentam a mágica pelo sumerograma SU.GI (a “velha”) ou pela palavra hitita hasawa que se aproxima de hasnupalla (“Parteira”). Toda a sociedade hitita desde a família reinante ao mais humilde dos súbditos, fazia apelo num dia ou noutro aos seus serviços. Uma “Grande das mágicas” presidia a esta importante corporação. No desempenho das suas funções, elas empregavam ingredientes variados (metais, tecidos, lã, terra, produtos, animais, plantas, etc).[…] A mágica confeccionava um substituto do doente que era preciso curar. Os demónios, causa da doença, passariam então para a figurinha feita à imagem do paciente.”, em [12], página 249. Até há bem pouco tempo julgava-se que o Yôga teria sido um produto trazido para a Índia por povos bárbaros por volta de 1500 anos antes da nossa Era. Em grande medida assim se pensava porque se crê que o sânscrito é língua trazida pelos povos bárbaros, era a língua dos deuses, dos sacerdotes, e os 50 caracteres do alfabeto dêvanágari estão intrinsecamente ligados com práticas de Yôga, nomeadamente ao Mantra onde, em grande medida, os bíjas são a repetição de letras deste alfabeto sânscrito utilizados, entre outras coisas, para desobstruir as nádí, estimular kundaliní, e estimular os chakra. A cada um destes 7 principais chakra correspondem bíjas [1], representados graficamente por caracteres de sânscrito. Logo, como o sânscrito vinha com os povos invasores, pensava-se que seriam também eles os transportadores do Yôga para a Índia.
Quadro 2 – Os Chakra, localização no corpo físico, e respectivo Bíja. Extraído do livro Chakras e Kundaliní, Mestre DeRose Mais recentemente no século XX a ciência comprovou que o Yôga já existia na Índia muito tempo antes dessas invasões bárbaras, através de artefactos arqueológicos descobertos em várias zonas destacando-se as cidades de Harappa, Mohenjo-Daro e um outro local denominado Lôthal, entre outros. A descoberta de um selo com a figura de Shiva, na sua variante Pashupati, senhor dos animais, vem provar que esta civilização já praticava Yôga, pelo menos na vertente das posições físicas do corpo humano, os Ásana. No entanto outras interpretações poderão também mostrar a existência de técnicas de meditação, como nos diz Clyde Winters em [9] que: “The posture of the man in the attitude of a yogi clearly suggest the practice of yoga among the Harappans. The buffalo-horn headdress indicates that this figure was a Dravidian dignitary, i.e., ‘ a man with horns’. The association of this figure surrounded by various zoomorphic deities of the Harappans, suggest that this seal encouraged its bearer to train his consciousness for a state of perfect spiritual insight and tranquility, so he could serve his God. The search of the Yogi for discipline of his mind and body, explains the wish inscription above the yogi figure :” Fate [provides] illumination,(and) increase God’s Justice. Preserve (my) righteousness and the Glory (of your) servant”. Quadro 3 – Cronologia Histórica do Yôga, com base na cronologia original feita por Shrí DeRose – Apresenta-se neste trabalho o quadro da cronologia histórica adoptado por João Camacho, Yôgachárya, o qual adicionou a coluna do lado direito de Resgate do Yôga Pré-Clássico. Shivaísmo
Fig 11 – Selo com figura de Pashupati, Senhor dos Animais, uma das representações de Shiva. Fonte: Sir Mortimer Wheeler em [6]
Segundo Alain Daniélou existem várias fontes indianas e com confirmação arqueológica, de que foi durante o sexto milénio a.C., um período que mais ou menos corresponde à revolução neolítica, que teve origem, foi revelado, foi codificado, o shivaísmo. Esta grande religião derivou de cultos que remotam ao homem pré-histórico relacionados com o animismo. Os rituais Shivaístas e os seus símbolos começam por aparecer mais ou menos ao mesmo tempo na Índia e pela Europa: o culto do touro, dos cornos, do falo, a cobra, a senhora das montanhas, danças sensuais, sacrifícios, etc. Um grande movimento cultural a partir da Índia até Portugal teve lugar em 6000 a.C. Este movimento é aparentemente relacionado com o Shivaísmo e é caracterizado por uma arte naturalista dando grande importância aos animais. A principal manifestação do Deus do Shivaísmo tem a sua representação no touro, ou num homem com cara de touro, ou um touro com cara de homem. O selo referido em cima encontrado em Mohenjo-Daro retrata Pashupati, onde podemos ver um homem com três faces e cornos como os de um touro. Os DrávidasSurgidos no neolítico entre o Mundas, as suas origens são ainda obscuras mas eles e a sua religião, o shivaísmo, tiveram um papel importante na história da humanidade. Como ensina Daniélou, alguns mitos apontam para a perdida Atlantis, da qual diversos grupos de sobreviventes foram dar a outras paragens como África e o Mediterrâneo. Os povos que povoaram a ilha grega de Minos não se pode dizer com precisão se eram oriundos da Anatólia, Pelasgo, Proto-Indo-Europeu, etc. A cultura e linguagem dravidiana é ainda hoje utilizada no sul da Índia, parecendo ter espalhado a sua influência da Índia para o mediterrâneo antes das invasões arianas. Foi esta civilização que serviu de veículo à propagação do shivaísmo, sendo visíveis as semelhanças de famílias linguísticas do Tamil dravidiano com o Basco (Eskuara), Georgiano, Creta, Suméria, etc. Danças e canções Bascas são parecidas com as dos caucasianos Ibéricos. Os vestígios vão por todo o mediterrâneo, existem inscrições em Praisos em caracteres gregos, que aparentam ser uma linguagem dravidiana. Modernos linguistas utilizam surpreendentemente hoje em dia aglutinadas linguagens dravidianas, que são largamente faladas no sul da Índia, como base para compreensão e pesquisa das línguas antigas do mundo mediterrânico. Os monumentos megalíticos existentes desde a Índia até à ilha da Grã-Bretanha [1] indicam que esta civilização foi o veículo do Shivaísmo. Após a última idade do gelo ocorreram grandes imigrações da Índia até Portugal, pois as condições climatéricas começaram finalmente a proporcionar um ambiente mais temperado que permitiu a expansão desta civilização agrícola. Esta cultura carrega os selos do pensamento Shivaísta, mitos e símbolos, e todos eles são mais ou menos contemporâneos nas cidades do Indo, Suméria, Creta e Malta. Os santuários megalíticos que são encontrados em toda a parte desde a Índia até às ilhas Britânicas pertence à mesma cultura. Os indígenas, na zona onde os drávida se estabeleceram, seriam um povo de pele escura e narizes pequenos. Quando aos drávida em si pouco se sabe das suas características étnicas. Porém, veneravam o falo (Shiva dêva). Tinham grandes terras e viviam em cidades fortificadas. Os textos vêdicos evocam lutas contra os dasya, os continuadores da civilização do Indo que rejeitaram o culto vêdico. Existem algumas teorias que no entanto lutam por contrariar esta dualidade entre drávidas e arianos, invasores e massacrados, bárbaros e civilizados, fazendo passar a ideia de que nunca existiu nenhuma invasão e de que na realidade são uma e a mesma coisa. Isto porque, inclusive, o norte e sul da Índia partilham uma mesma cultura e religião. Por outro lado houve a tentativa de caracterizar o Shivaísmo do sul como não-vêdico ou não-ariano. No entanto, o Deus Shiva claramente é sinónimo com o Deus Rudra, o qual também partilha muitas características com outras divindades vêdicas, tais como Agni, Indra e Soma. Adicionalmente, o Deus Shiva é uma divindade mais de perto associada com o rio Ganges do norte da Índia. Parece-me das variadas teorias existentes que existe uma boa possibilidade de na realidade serem dois povos diferentes mas uma mesma “cultura resultante”, fará mais sentido. Ou seja, a invasão existiu e os invasores arianos trouxeram uma escrita e uma língua que se veio impor mas para escrever e documentar uma cultura bem mais antiga e avançada. Essa cultura inicial sofreu uma adaptação para o domínio do patriarcal, e recebeu uma enormidade de deuses e mitologia vêdica própria dos bárbaros, sendo que embora adulterando e mascarando a cultura dravidiana, a cultura vêdica limita-se a ser o resultado da junção da ariana com a dravidiana, a junção do poder e cultura bárbara de sacrifícios às divindades, patriarcal, juntamente com toda a cultura dos símbolos e técnicas de um sistema matriarcal, adorador da Deusa, de Shiva-Shakti, da Yôni, do Lingam, do princípio criador feminino, e em certa medida também, do Yôga. Daí que alguns autores afirmem que embora subvertendo e adulterando, dando uma vestimenta mística e vêdica, toda a cultura pós-invasões, toda a cultura que começa a escrever as primeiras obras, os primeiros vêda, veio também garantir, ainda que escondido e difícil de filtrar, que o Yôga e a cultura dravidiana não se perdesse. Em certa medida também se pensa que o Atharva-Vêda, que é o 4º e último a ser escrito, no entanto o seu conteúdo reporta-se a realidades anteriores às relatadas no Rig Vêda, mais propriamente ao povo dravidiano e que vai bem para trás, para esse povo do neolítico, matriarcal, desrepressor e sensorial. Como nos diz Mestre Sérgio Santos: ”O Atharva Vêda, parte integrante de tal literatura, é o livro mais próximo do cotidiano do povo harappiano. Ele prescreve várias receitas para uma vida longa e para a felicidade e fazem-se homenagens à beleza e à fertilidade da terra: “Oh, terra! Agradável pelas tuas colinas, montanhas cobertas de neve e florestas; castanha, negra e avermelhada e de todas as cores…”, em [14], página 33. Os Arianos
Alain Daniélou, Marija Gimbutas, e outros autores, defendem que os arianos, erradamente apelidados de Indo-Europeus, eram originários de uma região localizada na actual Rússia e invadiram a Índia, o Médio-Oriente e a Europa. Por outro lado existem autores que dizem que os arianos e os drávidas eram um único povo. Existe a ideia de que os arianos pertenciam à espécie humana caucasiana, tipicamente de estatura alta, cabelo loiro, olhos azuis, originário da Ásia central, bárbaro e nómada. No entanto, outros autores defendem que na realidade os caucasianos aparecem ao longo da história com as mais diferentes características físicas, sendo que existem desde os caucasianos loiros e de olhos azuis até a outros quase negros. Tudo depende do local em que habitam no nosso planeta. Existem provas de que embora os esqueletos encontrados nos cemitérios em Harappa e Mohenjo-Daro sejam bastante cosmopolitas, todos se assemelham muito aos drávidas actuais do sul da Índia e aos aborígenes australianos. Poder-se-ia perguntar que, se existiram invasões então onde estão na Índia os descendentes dos olhos azuis e loiros? Há quem defenda que estão na Índia só que já não são loiros e nem têm olhos azuis, já serão um pouco mais escuros e de estatura média-baixa. A biologia e a genética explicam o que resulta do cruzamento de um nórdico com um latino, em que regra geral os genes dos latinos escuros ganham a luta da sobrevivência da “raça”, como aliás me recordo de ter crescido a ouvir dos meus pais, ex-colonizadores de África: “o cruzamento entre um branco e um indígena, produz um indígena”. Em relação ás origens dos arianos, George Feuerstein defende que M. Gimbutas e outros autores estão enganados quando defendem que os arianos são originários da Ásia Central, afirmando que esses autores se baseiam em simples possibilidades e conclusões em certa medida grosseiras. Defende também que as ideias de que os arianos (bárbaros e patriarcais), vieram da Ásia até ao norte da Índia, e se espalharam pela velha Europa aniquilando uma sociedade matriarcal e adoradora da Deusa, ao mesmo tempo que introduziam os seus deuses masculinos, são tudo teorias pouco consistentes, pois baseiam-se em análises das Línguas. Afirma Feuerstein que as origens das línguas são matéria sempre muito incerta e que nunca iremos ter certezas seguras, pois quando falamos e escrevemos de história estamos a simplificar, e necessariamente a omitir. O certo é que a teoria deste autor, que defende que nunca existiram invasões arianas, apresenta-se como um tipo de verdade absoluta, sem lugar para nenhuma dúvida possível, o que parece contraditório e talvez mais redutor do que a crítica que faz a outros autores. Nos textos vêdicos a palavra Arya significa nobre ou senhor, era assim que os arianos se tratavam a si próprios. Existirá uma semelhança entre Aria, Irão e Eire (antigo nome da actual Irlanda), o que poderá servir de prova às teorias que defendem a existência de uma expansão conquistadora, feita pelos arianos, que vieram da Ásia central até à Índia, e que continuaram pelo Médio Oriente, Europa, Mediterrâneo, e Ilhas Britânicas. Por outro lado as línguas destes povos são parecidas, têm semelhanças, são todas línguas Indo-Europeias. Um tema que não poderíamos deixar de mencionar foi quando Hitler e os Nazis, que se apropriaram do termo Árya e da Swástika, alegando que seriam eles os descendentes dos grandes conquistadores que alguns milhares de anos antes saíram da região da actual Rússia e que foram conquistar toda a Ásia Central, Índia, Mediterrâneo, norte de África, Europa, até lá acima à Grã-Bretanha. Tanto pensavam ser os descendentes que quiseram mesmo no século XX repetir a proeza. Estes povos bárbaros durante esse avanço conquistador teriam levado os cavalos e os carros de combate para a Índia, Egipto e Grécia, onde por volta de 2000 ou 3000 anos a.C. ainda não existiam. Embora também existem autores que pretendam hoje justificar que os cavalos já existiam na civilização do Vale do Indo. Os carros de combate puxados por cavalos foram desenvolvidos antes de 3000 a.C. e ofereceram aos guerreiros uma plataforma estável a partir da qual podiam disparar setas e lanças aos seus inimigos. O cavalo, que foi domesticado provavelmente por volta de 4000 a.C. nas estepes euroasiáticas, foi de grande importância para o povo que escreveu o Rig-Vêda porque o guerreiro a cavalo conseguia facilmente manobrar à volta do seu inimigo que se deslocava a pé. Os Textos
Segundo Shri DeRose, e abordando já um pouquinho do que mais adiante se fala sobre a polémica das teorias das invasões Arianas, apresenta-se no quadro 2 a estrutura do Hinduísmo. “…recordemo-nos de que o Yôga surgiu séculos antes do advento do Shruti, numa civilização que foi extinta justamente quando os Arianos ocuparam o seu território. O Vêdismo, que depois foi denominado Brahmanismo, e, finalmente, Hinduísmo, contém muitos elementos da cultura dravídica, mas diversos autores costumam negar isso.”, em [10], página 40. Diz-nos também este autor que: “O Shruti é a parte mais antiga, cujas raízes localizam-se há mais de mil anos antes da nossa Era. Shruti significa aquilo que é ouvido. O Smriti é divisão mais nova. A maior parte dos textos deste grupo tem pouco mais de 2.000 anos. Smriti significa memória, referindo-se provavelmente às recordações posteriores daquilo que o Shruti ensinara no passado remoto. Nesta parte mais antiga, o Shruti, temos então os 4 Vêdas: Rig Vêda, Sama Vêda, Yajur Vêda e Atharva Vêda.” O Rig Vêda é o mais antigo de todos os Vêdas, não necessariamente o que relata histórias mais antigas como iremos ver adiante. Trata-se de uma colecção de mais de mil hinos escritos entre 1200 e 900 a.C. por um povo conhecido por arianos, que veio para o actual Afeganistão, Paquistão e Índia, a partir das estepes euroasiáticas do norte. O Rig Vêda é uma das escrituras mais antigas e das primeiras a serem escrita em línguas Indo-Europeias. Voltando a fazer ligação com o Yôga temos que um vasto conhecimento, em relação ao qual o termo ayur-vêda se aplica, é algumas vezes considerado um 5º Vêda. A mais antiga expressão do conhecimento ayurvêdico pode ser encontrado no Atharva Vêda. O sistema ayurvêdico trabalha os 3 constituintes fundamentais ou qualidades principais que existem na natureza: Sattwa, Rájas e Támas. Sattwa significa estabilidade, Rájas, movimento, e Tamas inércia. São também conhecidos como os três Gunas: as qualidades que estão presentes em todos os planos da Natureza. Os médicos deste sistema trabalham a energia vital. Purificam as nádí, que são os canais por onde circula a energia vital, o prána, que no Swásthya Yôga trabalhamos no ashtánga sádhana como forma de reforço da estrutura biológica do praticante para que kundaliní ao despertar possa ascender pelos vários chakra. Os chakra são vórtices energéticos, que correspondem aos maiores plexos nervosos do corpo físico. A tradição Hindu reconhece sete pontos focais principais do prána. O Rig Vêda frequentemente fala dos 7 mundos, os 7 rios, os 7 sábios, os 7 conhecimentos, os 7 pránas, etc. Segundo Alain Daniélou, o Atharva Vêda documenta uma sociedade e um Yôga bem diferente do Yôga de Pátañjali, Yôga Clássico, que codifica na sua obra Yôga-Sútra, nascido em plena cultura vêdánta, ariana. Ao contrário, este 4º Vêda, é quase exclusivamente baseado em tradições pré-arianas no que concerne a rituais, magias e cerimónias. “O Atharva Vêda representa a verdadeira religião do povo” (P.Banerjee – citado por Alain Daniélou em [7]). É também este Vêda pré-ariano, que apresenta a antiga religião que foi adoptada pelos arianos. Religião Miceniana. Os Puránas (livros de história), Âgamas (livros de tradições) e os Tantras (livros de rituais mágicos e iniciáticos), descrevem os rituais autênticos, mitos e práticas dos shivaístas pré-arianos. Também deverá ser adicionada a filosofia ancestral Sámkhya(cosmologia) e os textos de Yôga, cujas origens são shivaístas e pré-arianas. No próximos quadro temos a estrutura do Hinduísmo. Em relação ao quadro número 4, Mestre DeRose faz questão de comentar que o “Yôga Pré-Clássico é mencionado nas Yôga Upanishads e que o Yôga que consta do Smriti é o Yôga Darshana ou Yôga Clássico, que surgiu cerca de 3.000 anos depois do Yôga Pré-Clássico”. Apresenta-se depois no quadro 5 um esquema das várias escrituras antigas organizado por Georg Feuerstein. Pode-se verificar que o Atharva Vêda para além da ligação directa ao Rig Vêda tem também uma ligação para o passado anterior ao Rig Vèda. É portanto identificado que do passado pré-vêdico temos os Purána (histórias que são contadas desde os tempos mais pré-históricos que sobreviveram através do parampará, transmissão da boca do mestre ao ouvido do discípulo), o Rig Vêda que foi o 1ª Vêda a ser escrito, e o Atharva Vêda, identificado por vários autores como o Vêda do povo pré-ariano, dravidiano. Tem também uma ligação futura que veio a resultar no sistema Ayurvêda que embora não tenha nada que ver com Yôga, trabalha de uma forma claramente prática (pelo menos até certo ponto, pois também tem uma grande dose de Vêdánta e espiritualismo), as mesmas estruturas energéticas do corpo humano. E utiliza para preparar os seus óleos, muito conhecimento típico das cidades matriarcais antigas, onde as mulheres tinham uma cultura e um conhecimento da natureza mais concretamente da flora, de onde retiravam os ingredientes necessários à concepção dos óleos essenciais ao tratamento de doenças. Quadro 4 – A estrutura do Hinduísmo segundo Mestre DeRose Quadro 5 – Estrutura do Hinduísmo segundo Georg Feuerstein Extinção: invasões ou causas naturais?
As teorias mais recentes apontam para um misto, um conjunto, de vários factores que levaram ao desaparecimento desta civilização. Entre estes factores estão causas climatéricas, geológicas e invasões violentas perpetradas por povos bárbaros vindos da ásia central, os arianos, que posteriormente se transformaram nos povos Indo-Europeus. Alterações Climatéricas
Sabe-se também que as civilizações se desenvolveram junto aos rios, foi assim em todo o mundo, e que particularmente nesta região do Vale do Indo, existiram profundas alterações climatéricas e na estrutura dos rios. Nomeadamente, as constantes inundações provocadas pelo rio Saraswatí, a posterior extinção deste rio motivada por secas prolongadas. Ora numa fase em que as civilizações puderam aparecer porque se começaram a fixar e a sedentarizar em determinadas regiões dedicando-se à agricultura, podendo armazenar o fruto do cultivo em celeiros que lhes permitia ter alimento durante todo o ano não necessitando de voltar a ser nómadas à procura de alimento, dependendo da água dos rios para este novo estilo de vida, é óbvio que quaisquer alterações climatéricas profundas que se tenham verificado podem claramente ter iniciado e contribuído para um processo de declínio do equilíbrio em que floresciam. Existem sem dúvida mitos e histórias implantadas nas culturas ancestrais que referem sempre um dilúvio, a grande inundação. Sabemos hoje que a natureza pode produzir ondas gigantes que entram terra dentro como consequência de terramotos. Por outro lado não podemos esquecer que os meteoritos de dimensões consideráveis têm atingido a terra ao longo dos tempos e o impacto de um meteorito de tamanho considerável no oceano causa vagas de ondas que nos escapam a imaginação. É certo que hoje essas catástrofes, até certa medida, também causam a mesma devastação. No entanto, temos maior capacidade de recuperação, pelo que para a nossa extinção seria necessário uma de grandes proporções. Já, naquela época, qualquer menor catástrofe natural, tinha um impacto sempre muito significativo, não só no imediato da ocorrência mas porque muito mais dificilmente e lentamente as populações era capazes de recuperar desses eventos. Na cultura bíblica temos Noé e a sua arca, na suméria temos UtaNapishtim que também construiu uma arca para se salvar a si e aos seus segundo ordens do deus Enki. No épico Gilgamesh que serviu posteriormente aos autores do dilúvio bíblico, estão documentadas grandes cheias que Sir Leonard Woolley conclui ter encontrado prova numa camada de lama com cerca de 12 pés que teve de escavar até encontrar artefactos em Ur, algures antes de 3000 a.C.. Os Indianos datam de 3102 o início da presente Era mundial, Kali-Yuga. Os Maias do outro lado do mundo também têm uma data de 3113 para uma grande inundação. Poderemos portanto estar perante um fenómeno de dimensões avassaladoras, global a todo o planeta, que marcou todas as antigas civilizações sensivelmente ao mesmo tempo. A ilha de Santorini (Thera) tinha um vulcão que explodiu em 1628 a.C. que causou uma onda devastadora que atingiu todo o mediterrâneo, palestina e Egipto, que destruiu a civilização de Minos da Grécia (por volta da 1200 a.C. esta civilização já estava no seu processo final de declínio). Pensa-se também que a civilização Mesopotâmica terá desaparecido e sido arruinada por fortes erupções vulcânicas seguidas de profundas alterações climatéricas. Esta civilização atingiu a sua Golden Age em 2371-2316 a.C. durante o reinado de Sargon, que reinou por 57 anos, e continuou a florescer durante o reinado do seu filho Rimush e o seu neto Manishtusu em 2307-2292 a.C. E depois, de repente e após um século de supremacia, o império misteriosamente colapsou. Cidades foram abandonadas quando uma agricultura que falhou não lhes conseguiu mais dar o suporte que precisavam. Pensa-se hoje segundo análises recolhidas por geólogos que tudo se deveu a erupções vulcânicas muito próximas, talvez na Turquia, que cobriram a terra de cinzas. O certo é que três séculos mais tarde as populações regressaram para criar a Babilónia. Mais concretamente relacionada com a Civilização do Vale do Indo, aparece a teoria climatérica e geológica relacionada com o rio Saraswatí. Este rio terá sido muito maior do que é hoje e possuído vários afluentes, considerando alguns hinos dos Vêdas como sendo o “grande rio”. Saraswatí no Hinduísmo é a esposa de Brahma e mais tarde aparece também relacionada com Vishnu. Originalmente o rio Saraswatí flui através do Rajasthan até ao Golfo de Kutch perto da península de Kathiawar. Segundo recentes imagens de satélite o Saraswatí e os seus afluentes formavam um imenso sistema de água e solos férteis no que é hoje o Deserto do Thar, também conhecido como o grande deserto da Índia. O que terá causado esta seca e o desaparecimento desta estrutura de canais? Alguns geólogos apontam para grandes alterações das placas tectónicas por volta de 1900 a.C., possivelmente acompanhadas de erupções vulcânicas que de forma drástica e irremediável alteraram a estrutura dos rios, o que transformou a região num deserto. Também alterações foram sentidas no rio Indo e no Ganges mas não tão intensas e foi para lá que se terão mudado as populações, migrando do Saraswatí para o Ganges. Invasões Bárbaras
A favor da teoria das invasões arianas:
Não há dúvida que existiram grandes migrações de povos asiáticos em direcção a estas regiões que manifestamente alteraram para sempre o equilíbrio existente nas regiões e povos conquistados. Estão documentadas guerras e invasões nestes períodos entre o povo invasor ariano e os drávidas como aliás nos diz Salomão Reinach: “Vejamos primeiro que tudo, o que significa a palavra Ária. Na língua clássica da India Antiga, o samscrito, arya é um adjectivo que quer dizer nobre; mas na lingua dos hymnos denominados Vêdas, os quais pertencem a época anterior, o termo arya, até certo ponto pelo menos, parece ser uma designação ethnica, applicada ao grupo de conquistadores que introduziram na India a língua falada pelos poetas dos Vêdas. Ahi os árias oppõem-se aos dasyas, como o povo invasor que se oppõe ás populações contra as quais lucta e acaba por subjugar. A origem do termo arya é desconhecida, e só por hypothese, assás inverosimil, é que se procurou relacionar esse termo com a raiz de arare que significa cultivar ou lavrar.”, em [4], páginas 102 e 103. No Rig Vêda os Dasyas aparecem acompanhados pelos Symias a atacar os Indo-Arianos. Os Rig Vêda são uma colecção de mais de 1000 hinos escritos entre 1200 e 900 a.C. por um povo conhecido por arianos, sendo esta uma das primeiras obras a serem escritas em línguas Indo-Europeias. Segundo interpretação de Stuart Piggot o Rig Vêda descreve os habitantes de Harappa como “pretos”, “sem nariz”, “lascivos e libidinosos”, esta última uma referência ao fálico deus Shiva. Descreve também que os oponentes dos Arya, esses inimigos que se atrevem a recusar a supremacia de Indra na terra e nos céus, são referidos como os dasyas, que não têm rituais, são indiferentes a deuses, de fala imperceptível, não executam os sacrifícios arianos, e eles provavelmente fazem culto ao Phallus, Lingam, e acima de tudo eles são os infiéis. Caracterizam-nos no entanto como muito saudáveis, com grandes reservas de ouro, estão organizados em grupos ou estados, e vivem em estruturas fortificadas. Citando Sir Mortimer Wheeler, Piggot chama a atenção que as recentes escavações de Harappa julgam-se ter alterado o que se sabia, pois revelam uma altamente evoluída civilização de tipo essencialmente não ariano, que construíram massivas fortificações, e que dominavam o sistema de rios da região noroeste da Índia num período não muito distante da altura provável das invasões arianas. Versos do Rig Vêda que mencionam as invasões:
“With all-outstripping chariot-wheel, O Indra, thou
Este é um hino do primeiro livro do Rig Vêda(I,53). As fortificações destruídas por Indra diz serem de pedra, o que pode referir a tijolos de barro não cozido. O ataque parece ter incluído pegar fogo aos edifícios:
“… in kindled fire he burnt up all their weapons,
E é possível que se encontrem referências à destruição das barragens e diques que foram construídos para proteger a cidade de Harappa das inundações provocadas pelas cheias. A associação de cheias, inundações e conquistas é mais uma vez potenciada no mesmo hino:
“ The mighty roaring flood he stayed from flowing, and carried those who swam not safely over, They having crossed the stream attained to riches …
E mais uma vez “he sets free the rivers paths” e “all banks of rivers yielded to his manly might (II, 13)”. No passado estas fortificações dos dasyas eram considerados ou mitológicas ou na melhor das hipóteses as primitivas construções dos aborígenes do norte da Índia no tempo das conquistas arianas. Mas agora tal como escreveu Wheeler: “the recent excavation of Harappa may be thought to have changed the picture. Here we have a highly-evolved civilization of essentially non-Aryan type, now known to have employed massive fortifications, and known also to have dominated the river-system of north-western India at a time not distant from the likely period of the earlier Aryan invasion of that region … On circumstantial evidence, Indra stands accused.‘” Segundo Ferreira do Amaral em “Os Filhos de Caim e Portugal”, os Umman Manda são a primeira invasão que ocuparam zonas da Mesopotâmia e principalmente na zona do Indo que mais tarde vão refluir para o Ocidente. Sabemos também que o povo Drávida e Tamil, nos dias de hoje, é mais predominante no sul da Índia e no Sri Lanka. Mas que existem também vestígios deste povo adorador do falo por toda a Europa mediterrânica, são disso exemplo os cromoleques, sendo assim visível o efeito que a vaga invasora vinda das estepes euroasiáticas de povos bárbaros produziu, “empurrando” esta cultura inicial dos dasyas para sul e para a Europa, quer por fuga desesperada quer por inclusão no movimento contínuo e posterior invasor dos arianos que continuaram as suas conquistas, agora integrando símbolos dos dasyas, drávidas. Característica esta que se pensa ser uma constante, ou seja, os arianos foram integrando várias características dos povos conquistados, impondo a sua ordem bárbara, patriarcal, violenta, transportando consigo indirectamente os símbolos e cultura dravidiana. Em última análise pelo simples facto de que no continuar das suas conquistas faziam viajar com os seus exércitos algumas multidões de escravos drávidas, os quais mantinham a sua cultura. Veja-se o que foram as sanzalas de escravos no tempo das conquistas da época dos descobrimentos e colonização de África, ou em qualquer outra parte do mundo na altura da escravatura. Mesmo no contexto de uma ordem instalada de cariz papal, nomeadora de reis ditadores, mesmo assim, nas sanzalas dos escravos, as comidas, os cânticos, as religiões e cultos praticados eram as dos escravos, eles mantinham as suas tradições, obviamente numa sociedade em que eram claramente a excepção numa regra colonizadora. Esta ideia é apoiada por Pierre Levêque que sempre existiu, embora em graus diversos, fusão entre os conquistadores e os conquistados. Os Hititas tomaram o seu próprio nome dos Hattis que conquistaram. “Os sincretismos religiosos testemunham a importância do substracto étnico que não podia ser eliminado pelas conquistas, e isso é verdade desde a Grécia antiga até à Índia Ariana: em toda a parte têm tendência para perdurar, designadamente à volta das Terras-Mães, as grandes religiões da fecundidade/fertilidade, de inspiração neolítica, religiões naturistas melhores adaptadas às aspirações dos camponeses, aos seus problemas, às suas esperanças de uma vida na eternidade. No entanto esta fusão nunca foi de união e partilha, sempre se manteve o comando e a subjugação dos conquistados pelos conquistadores, as populações conquistadas são recuperadas como força de trabalho, existindo esta clara separação social, e isso é mais visível na Índia onde a sociedade se estrutura em quatro varna, cores, desempenhando a cor, um papel diferenciador considerável: ”às três camadas da herança indo-ariana teve de juntar-se uma última categoria social, desprezada mas de facto integrada, que é a dos negros drávidas que era preciso incorporar de algum modo na comunidade vêdica”. Diz-nos no entanto Alain Daniélou que “the dravidian language and culture, which even today are those of the population of Southern India, seem to have spread their influence from India to the Mediterranean before the Aryan invasions”, em [7], página 21. O que vem propôr uma outra visão a qual advoga que por exemplo, a existência em Portugal de vestígios de uma civilização com monumentos Megalíticos (cromoleques), poderá ter partido não de migrações motivadas por invasões que teoricamente fizeram fugir o povo drávida dos arianos para o sul da Índia, mas mais pelo facto de que toda essa região, que vai desde o Vale do Indo até à Península Ibérica e bem lá acima até Stonehenge, ser caracterizada por um clima verdadeiramente civilizador, pois permitia a organização do cultivo e colheita agrícola, que conduziam à sedentarização e impulso civilizacional como nos explica André Van Lysebeth em [3]. É também adepta desta ideia M. Gimbutas, que Pierre Levêque menciona em [11], para apresentar as migrações dos Kurganes, à sua evolução e expansão, que se divide em várias fases do V ao II milénio antes da nossa Era, onde se dá a conquista em direcção à Europa Danubiana e à Europa Nórdica, numa muito ampla indo-europeização, durante dois ou três milénios. Esta primeira fase é seguida de uma segunda fase que dura até à Idade Média. Através destes séculos são grandes os grupos de emigrantes que em movimentos sucessivos asseguram a conquista da Europa e uma parte importante da Ásia (Ásia anterior e Norte do subcontinente indiano). “Na Europa é uma ocupação contínua onde só alguns enclaves escapam à indo-europeização, como o das línguas euscaro-caucásicas de que subsistem apenas vestígios nas duas extremidades do continente…”, em [11], página 39. Fig 12 – Sinais claros de massacre, os corpos ficaram na posição em que morreram, os sobreviventes puseram-se em fuga, ninguém ficou para trás que pudesse proceder aos seus funerais. Fonte: Sir Mortimer Wheeler em [6] Embora esta dinâmica migratória esteja longe de ser clara, no entanto, existe um único ponto comum a elas, e esse ponto é o impacto considerável que elas têm nos locais onde estes migradores se sedentarizam, os quais se impõem com a sua língua. “Luvitas e Hititas subvertem o equilíbrio da Anatólia e da Síria. A chegada dos Gregos à Grécia é marcada por um verdadeiro hiato arqueológico, isto é, pela destruição dos palácios de Bronze antigo. Os Iranianos ocupam o planalto interior, muito antes de os Medos e os Persas fundarem os seus grandes reinos. Na Índia do Norte, os Arianos levam a melhor sobre as populações drávidas”, em [11], página 40. Outra referência nos apresenta Ferreira do Amaral em relação às invasões dos povos bárbaros asiáticos: “Por outro lado ainda, um hino contemporâneo em honra de Sesóstris III menciona o ataque ao Egipto, repelido pelo faraó, por parte de povos estrangeiros asiáticos”, em [5], página 23. E continua com: “Na primeira metade do II milénio, a zona da Bactriana e da Índia do Norte é, com efeito, povoada por povos indo-europeus que se guerreiam entre si, como se pode verificar das partes mais antigas dos Vêdas (Rig Vêda). […] Os Indo-Arianos combatem povos como os Gandara […] Dasyas […] Chomari […], parni […]. Nesta fase dos Rig Vêdas, não há razões para supor que os indo-Arianos se estejam já a expandir para o Sul para a Índia. Os Vêdas referem-se fundamentalmente à zona noroeste da Índia […]. No entanto, é também por esta altura da primeira metade do II milénio que a civilização do Indo entra em decadência e vai desaparecendo gradualmente, não existindo razões para supor que esse desaparecimento tenha sido directamente causado por ataques Indo-Arianos.”, em [5], páginas 38 e 39. No entanto segundo Sir Mortimer Wheeler: “… it is widely accepted that somewhere about the middle of the II millenium occurred the Aryan invasion which is reflected in the earliest literature of India, the hymns of the Rig Vêda. […] Mohenjo-Daro is the only place where clear material evidence of final massacre is at present forthcoming”, em [6], páginas 113 e 114. Temos portanto uma primeira teoria que defende que a região do Vale do Indo estava habitada pelo povo drávida, que em várias ocasiões espalhou a sua cultura por um extenso território desde a Índia até às ilhas Britânicas. Esses deslocamentos poderão ter ocorrido em duas fases, no sentido da Índia para a Península Ibérica. Numa primeira fase, por intermédio de uma expansão pacífica feita por um povo que entretanto dominou a agricultura, avançando pelos territórios com melhores condições para este estilo de vida, existindo vestígios destas deslocações durante a Revolução Neolítica e o Megalítico. Numa segunda fase, arrastado e motivado por invasões violentas dos povos bárbaros que saíram das estepes euro-asiáticas e que empurraram, arrastaram, os povos conquistados, que se tiveram de deslocar em fuga ou mesmo já integrados, absorvidos, através do Mediterrâneo e Norte de África. Para dar força e consistência a esta explicação das migrações dos povos motivada por uma invasão do Vale do Indo feita por povos bárbaros, que se expande e continua pela Europa, existem as escrituras antigas, os Vêda, que apresentam sinais de combates entre o povo invasor bárbaro contra os dasyas. Os drávidas tentaram resistir à aniquilação física e cultural, existindo vestígios de violência nas descobertas feitas nas cidades do Vale do Indo, e também é notório que num dado momento se passou de uma sociedade matriarcal para uma sociedade patriarcal. No sentido da Península Ibérica para a Índia, existe como possível a ideia de o povo dos monumentos do megalítico ter nascido na Europa e ter-se posteriormente expandido até à Índia, para defender a teoria de que os próprios drávida não eram originários da Índia mas antes, da Europa.
Fig 13 – Mapa do território Indo-Asiático, onde se destaca a localização da cidade Mehrgarth, Harappa e Mohenjo-Daro. Também a localização do que antigamente era o Grande Rio Saraswatí e hoje deserto. Fonte: Georg Feuerstein em [8]
Contra a teoria das invasões arianas:
Como segunda teoria, ou mais concretamente, outra opinião, tem George Feuerstein, juntamente com outros autores. Este autor contraria e nega principalmente tudo o que esteja relacionado com as teorias das invasões arianas, as quais tem batalhado por desmistificar e desmontar. Aliás, nota-se especial preocupação neste autor em ir contra essa ideia de invasões de povos bárbaros, inclusivé está também mais recentemente a desmontar e contrariar uma teoria que afirma que os próprios drávidas nunca foram indígenas da região do Vale do Indo e que foram também eles invasores daquela região. Existem ideias de que o Shivaísmo terá nascido não na antiga Índia mas em várias partes do mundo ao mesmo tempo pois os vestígios de símbolos destas culturas estão espalhados por toda a Europa e datações por meios científicos revelam que no mesmo período no tempo estes símbolos surgiram por toda a Europa. Pensa-se inclusivé que o fluxo migratório desta civilização poderá ter vindo em sentido contrário, ou seja, da Europa para o Vale do Indo. Mas mesmo esta teoria Feuerstein se apressa a desacreditar. Este autor presentemente atribui maior importância às descobertas recentes feitas em Mehrgarth, a maior cidade da inicial antiguidade, algures em 6500 a.C. bem na Revolução Neolítica, o que coloca esta cidade como contemporanea de Çatal Huyuk na Anatólia, Jarmo na Mesopotâmia, e Jerico na Palestina. Esta cidade revela pela grandeza e vestígio arqueológico como sendo muito semelhante ao estilo urbano de Harappa e Mohenjo-Daro com a diferença de ocupar uma área bem maior e de ter florescido 4000 anos antes das cidades do Vale do Indo. Feuerstein aliás revela-se um dos mais cépticos autores sobre estes temas, e em certa medida serve de contraponto a todas as teorias e sugestões avançadas por outros autores, parecendo que quando escreve se centra na crítica a quem “ousa” avançar com certezas sobre o que quer que seja. Inclusivé em [8], Feuerstein dá-se ao trabalho de apresentar 17 razões pelas quais segundo ele nunca existiram invasões arianas. No prefácio de In Search of The Cradle of Civilization consegue perceber-se em certa medida o porquê destas suas posições, parece ser algo avesso aos autores e à ciência de estimação, “… when it cames to pet theories and cherished opinions, scientists are as human as anyone else”, em [8], página XX. Temos tendência a julgar que os nossos cães e gatos por serem nossos companheiros e em certa medida nossa realização, acreditamos e defendemos com todas as forças que foram incapazes de fazer as suas necessidades nas portas dos vizinhos, assim também os cientistas têm tendência a considerar e a respeitar teorias só porque são suas ou de “pessoas” muito estimadas na comunidade científica e investigadora. Parece-me no entanto cair na mesma “ratoeira” quando utiliza “opiniões” de Aurobindo e Colin Renfrew só porque são “grandes” personalidades em determinadas áreas. Dessas 17 negações (faço um parenteses humorístico irresistível, em que mais parece que Feuerstein é praticante de Jñána Yôga, e aprecia bastante a técnica de “neti-neti” – não é isso; não é isso), destacam-se:
Com estas e outras justificações Feuerstein preocupa-se em desmontar a ideia instalada de uma invasão ariana muito redutora da história que ainda pouco conhecemos, e o autor defende que ao assumirmos a existência de uma cultura vêdica muito mais antiga do que a invasão ariana, juntamente com os achados em Mehrgarh, seremos então mais capazes de virar a nossa imaginação histórica para aspectos específicos da antiga cultura e história indiana. Misto de Várias Causas Existem teorias de que estas invasões vieram encontrar uma civilização já em profundo declínio e que não foram a causa principal da sua extinção, mas o certo é que existem interpretações dos Rig Vêda que atestam a destruição de represas do Rio Indu por parte dos árias, que destruiu o equilibrado sistema criado pela civilização do Vale do Indo. Temos assim também a possibilidade de que a água que hoje se encontra nas escavações de Mohenjo-Daro e Harappa, essa água que parece ter irremediavelmente alagado esta cidade tornando-a difícil de habitar será não consequência de alterações da estrutura de rios que alagaram a civilização que junto deles floresceu, por causas climatéricas ou geológicas, mas antes pelo simples facto de os invasores terem destruído as represas. Pense-se um pouco o que aconteceria à região do Vale do Tejo em Portugal se fossemos agora por esse Tejo acima dinamitando todas as barragens? Por certo vilas e aldeias de Santarém desapareciam, por exemplo. Claro que se introduzirmos aqui as teorias das catástrofes geológicas de dimensões avassaladoras naquela região, então não foi sabotagem dos arianos, mas antes “sabotagem” da Mãe Natureza que se manifestou alterando o sistema de rios e lançando para o ar poeiras vulcânicas que impossibilitaram a continuação das condições de vida típicas da civilização harappiana, fazendo-a entrar em decadência. Conclusão
Esta era uma civilização que vinha desde a Revolução Neolítica, matriarcal, que durou até ao início da Era dos metais, altura em que se tornou adoradora das mais variadas divindades, espiritualista e patriarcal. Quando se iniciaram as invasões bárbaras e várias migrações com intuito de conquista violenta em toda aquela região, esta civilização começou a entrar em decadência. Adicionalmente ocorreram fenómenos climatéricos que influenciaram esta região em várias ocasiões ao longo do tempo, e ainda hoje continuam a ocorrer, e é razoável admitir que grandes catástrofes naturais podem sem dúvida aniquilar todo um sistema estável que vai causar o deslocamento de populações para outras regiões e consequente decadência. Procurou-se apresentar o maior número de informação, ainda que de forma muito breve, do que se sabe e teoriza sobre esta civilização e estes tempos. Fica a vontade de em estudos posteriores nos debruçarmos mais sobre a relação entre sociedade matriarcal e patriarcal. Isto porque, tenham ocorrido catástrofes ou invasões bárbaras, ou as duas em conjunto, o certo é que a partir de determinado momento passamos de vestígios de uma sociedade matriarcal, para uma sociedade patriarcal. Onde antes a mulher era a Deusa, a coordenadora das mais diversas actividades da sociedade, temos depois a transformação para uma sociedade patriarcal, na qual a mulher passou a ser um mero objecto de uso e ao serviço do homem, sem quaisquer direitos reconhecidos. Verificando-se que se passou de uma sociedade sensorial e adoradora da natureza, para uma sociedade bárbara, bruta, guerreira, adoradora de Deuses e Reis, sempre predominando a superioridade do homem em relação à mulher. O que se mantém até aos dias de hoje no mundo inteiro e com maior evidência no Médio Oriente e na Índia, principal e infelizmente. Não deixam tudo de ser conjecturas, mas as provas quer de um lado quer de outro são de alguma credibilidade e por isso creio ser essa a causa geradora da grande controvérsia sobre o que realmente terá levado à extinção desta civilização, ou se não se extingiu, se sempre foi a mesma, ou se passou a ser a mistura de várias. Está por certo muita coisa por explicar e com maior precisão. Nomeadamente a questão de sociedade matriarcal versus patriarcal. A objectividade é importantíssima aos estudiosos destes temas, pois muitas vezes se nota alguma parcialidade, pois no campo das teorias muito cunho pessoal se pode colocar, o que leva a esta ou àquela interpretação da história e dos factos existentes. O certo é que as origens do Yôga remontam a este período histórico, e a este local do nosso planeta. Embora com mais ou menos controvérsia, com mais ou menos certezas e incertezas, que não permitem até certo ponto um consenso sobre a escrita da história destes tempos, estou certo no entanto de que não ficam dúvidas de que é daqui que vem e nasce o Yôga Antigo, com linha Tantra (matriarcal, sensorial, desrepressora), e tendência Sámkhya, o Yôga que foi codificado no século passado por Mestre DeRose, o Swásthya Yôga. Bibliografia:
[1] Wheeler, Mortimer, “Civilizations of The Indus Valley and Beyond”. Thames and Hudson, London 1966. [2] Hermano Saraiva, José , “História de Portugal”, 7ª Edição, Publicações Europa-América, 2004 [3] Van Lysebeth, André, “Tantra el culto de lo feminino” [4] Reinach, Salomão, “ A origem dos Arias”, tradução de agostinho fortes, Bibliotheca D’Educação Nacional XXIII, Lisboa 1912. [5] Ferreira do Amaral, João, “Os Filhos de Caim e Portugal”, povos e migrações no II milénio a.C., Quetzal Editores, Lisboa 2004 [6] Wheeler, Mortimer, “Early India and Pakistan”, Thames and Hudson, London 1959. [7] Daniélou, Alain, “Gods of Love and Ecstasy, The traditions of Shiva and Dionysus”, Inner Traditions International Ltd, Rochester Vermont 1992 [8] Feuerstein, Georg, “In Search of the Cradle of Civilization”, Quest Books Theosophical Publishing House, Wheaton Illinois 2001 [9] Winters, Clyde, “The decipherment of the Indua Valley writing”, Internet Link: http://www.geocities.com/olmec982000/HarWRITE.pdf, disponível e consultado em 18/04/2006 [10] DeRose, Mestre, “Origens do Yôga antigo”, Editora Uni-Yôga, São Paulo 2002 [11] Lévêque, Pierre, “As primeira civilizações – Os Impérios do Bonze”, Volume I, Edições 70, Lda, Lisboa [12] Lévêque, Pierre, “As primeiras civilizações – A Mesopotâmia / Os Hititas”, Volume II, Edições 70, Lda, Lisboa [13] piggott, Prehistoric Roots of Ancient India, Penguin, Harmondsworth 1950 [14] Santos, Sérgio, Yôga, Sámkhya e Tantra, 4ª Edição, Editora Uni-Yôga, São Paulo Brasil 2001 [15] DeRose, Origens do Yôga Antigo, 1ª Edição, São Paulo Brasil 2004 [1] Ver Gimbutas, que fz um extenso trabalho arqueológico na Europa, apó a 2.ª Guerra Mundial, assim como Daniélou e Van Lysebeth. [1] Os 7 principais chakra são de baixo para cima: múláddhára, swádhisthána, manipura, anáhata, ájña, sahásrara. No Yôga Ultra-Integral são trabalhados explicitamente através de exercícios respiratórios, meditação, e outras técnicas, estes 7 principais chakras, sendo que implicitamente são também trabalhados todos os outros milhares.
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Júlio Hugo Da Silva
Trabalho apresentado para o Exame de Candidatura a Yogachárya
(C)Copyright, Júlio da Silva, 2006