O guru tântrico
Desde sempre o guru tem sido o pilar do tantra (…) sua relação com o discípulo alcança uma intensidade e uma intimidade que só podem compreender os que a viveram.
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A afirmação «quando o discípulo está preparado, o guru aparece» é literalmente certa. Porém o adágio oposto também é verdadeiro: «quando o mestre está pronto o discípulo aparece». O seu encontro, imprevisível, é um acontecimento que marca as suas vidas de forma tão indelével como uma tatuagem. Assinalamos que, no tantra, guru e chêla são com frequência do sexo oposto e que «o» guru pode ser também «uma» guru.
Nem o discípulo nem o guru saem à procura um do outro: esperam que isso se produza. Este não programável «isso» escapa à sorte que rege a maioria dos encontros humanos. Em muitos sentidos, parece-se com a flechada amorosa, porque se reconhecem de entrada. Em quê? Pergunta sem resposta: é assim, e isso basta. Eles sabem-no. O seu encontro, misterioso, parece-se mais com um achado do que com um descobrimento. Cria de entrada entre eles um laço inelutável, definitivo e carregado de emoção: «depois» nada é como «antes».
O guru tântrico é ao mesmo tempo um instrutor, um mestre, um depositário da tradição e um guia que dissipa as dúvidas, que transmite um ensinamento e técnicas, que dirige a prática.
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A reciprocidade de sua relação produz uma catálise psíquica. O que nem um nem outro poderia realizar isolado, separado, produz-se na presença recíproca. Em nenhum caso se trata de uma relação de subordinação, nem sequer a que existe entre um mestre que sabe, ensina, domina, e um aluno aplicado, submisso. O guru não explora, jamais os seus discípulos; a exploração é uma característica dos pseudogurus. Esta relação tampouco vai em um sentido único, dando um, recebendo o outro. O guru recebe pelo menos tanto quanto dá (…)
Esta relação depende de uma condição essencial: praticar juntos, e sua relação guru-chêla se lhes revela frequentemente por esse facto de que desde as primeiras práticas se desencadeiam reacções espectaculares (…) Ademais, a sua relação é definitiva: não existe um «divórcio». (…) Na sua meditação quotidiana, se unem no plano subtil, mas, incluído sem meditação e sem tomar consciência disso, os seus psiquismos permanecem em contacto constante (…).
Este encontro é excepcional, mas existe. Às vezes guru e chêla vivem na proximidade durante muitos anos, a evolução de um ecoando sobre a do outro, graças à misteriosa catálise a que me referi antes.
Van Lysebeth, Tantra. el culto de lo Femenino, pp. 313-314